10 de setembro de 2015

Uma certa maneira de ser


Dia 20, domingo, espero que esteja um lindo dia de sol, sem vento, temperatura ali a rondar os 25º/27º para que eu possa ir, calmamente, alegremente e pujantemente, fazer uns quantos quilómetros na minha bina nova, na companhia das minhas velhas amigas, e depois, cansada mas feliz, possa comer 2 tortas de Azeitão, ou mesmo 3.
Estar com os meus amigos, a fazer as coisas que gosto, é a melhor manifestação que posso fazer em prol dos refugiados.
Estar com amigos, no meu país, a usufruir do bom tempo que ele me proporciona e da vida que ainda consigo suportar economicamente é um exercício que me trará mais um dia de felicidade e eu gosto de coleccionar esses dias, infinitamente.
Deixaremos os problemas de lado, os nossos e os dos outros, e sobretudo dos que ainda não existem, e discutiremos freneticamente coisas banais como por exemplo: qual o melhor local para se petiscar um choco frito, ou ainda, onde se degustará o tal famoso rodízio de peixe na doca de Setúbal.
Estou-me positivamente lixando para manifestações de xenofobia aguda que passam aqui na estafada Avenida, e além disso não estou em condições absolutamente nenhumas para perder um dia sequer do meu precioso verão, que definha a cada dia, para me enfiar no meio dum careiro de formigas descontroladas que quando souberam que meninas africanas ali num bairro de Loures eram submetidas à mutilação sexual, encolheram os ombros e continuaram nas suas vidas, muito longe da calçada que desce até ao Tejo, e onde eu e parcos transeuntes acenávamos bandeiras.
Os refugiados virão para Portugal à procura de um refúgio, de calma e de paz.
Deveríamos conceder-lhes essa possibilidade sem alarmismos, sem manifestações e de forma o mais solidária que conseguíssemos.
Sem barulho e sem gritarias.
Assim só estamos a criar inimizades desnecessárias, atenções dispensáveis e a fazer um alarido totalmente estúpido sobre uma acontecimento que no fundo é totalmente banal, já que qualquer pessoa sempre foi livre de entrar em Portugal, islâmico, judeu, ateu, cristão ou outra fé qualquer.
Portugal (eu e outros amigos portugueses) estaremos unidos no dia 20 de setembro para fazer um brinde a vida (e às boas pedaladas) e também à infinita sorte e misericórdia de podermos viver num país que se pode dar ao luxo de receber refugiados de guerra.
O espírito de Aristides Sousa Mendes é uma certa maneira de ser ... português!
Pensem nisso.

13 comentários:

  1. Permite-me discordar. Não querendo compactuar com os que se revelam contra, mas também não conseguindo ficar ao lado dos que dizem sim sem qualquer dúvida, quero apenas lembrar que qualquer pessoa sempre foi livre de entrar e permanecer mas não de ser sustentada e impôr-se contra as regras vigentes. Claro que a situação agora é nova, mas por isso mesmo não pode ser comparada a outras que pouco têm de semelhante. As pessoas têm receio porque existe informação sobre o que tem acontecido nos países onde as comunidades islâmicas estão instaladas. Acredito que os que sofrem com a guerra têm que ser ajudados, mas não quero o meu país transformado num local onde nem todos os portugueses possam circular livremente. Deixem entrar os Sírios, ajudem, mas mantenham-nos devidamente sinalizados e em caso de promoverem algum tipo de confronto ou franca inadaptação à nossa sociedade, devolvam-nos à precedência. Acredita que com estas garantias muitas pessoas iriam abrir mais os braços.

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    1. Na minha modesta opinião (que não estou muito convencida com o abrigo que vai ser dado) o problema é precisamente este... temos visto o que acontece noutros países, temos a "certeza" que dificilmente quem vier virá de mente aberta para mudar costumes, tradições e pensares (com as devidas excepções obviamente) e não nos é dada garantia nenhuma de que se correr mal não seremos nós a ter que nos adaptar a eles.
      Não discordando a 100% de que devemos ajudar, também não posso ser totalmente a favor quando tantos dos nossos estão na miséria sem uma ajuda sequer e para mais tendo os pressupostos acima.
      Veremos se não vai haver arrependimentos....

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    2. Creio, caro anónimo, que ainda ninguém está em condições de dizer que os refugiados vão ou não impôr-se contra as regras vigentes, vão ou não causar distúrbios, vão ou não impor a sua fé. A informação que temos sobre a comunidade islâmica em Portugal é que cá estão há 47 anos e que são cerca de 50 mil. Sabia? Não sabia porque nem dá por eles tal é o seu nível de integração.
      Extraditar estrangeiros quando eles se portam mal, estou de acordo, mas como, e no caso, estes não têm para onde voltar, ficam exatamente em que sítio? Outra vez à deriva? É isso que temos de perceber. Assumir uma pessoa é assumi-la com e sem defeitos.
      As pessoas não são electrodomésticos que se possam devolver à procedência.
      São só 4 500 almas. Muitas delas crianças de colo, pequenas e mulheres. Não me parece que andem ai por Lisboa a mandar bombas, até porque vieram só com a fome e a roupa do corpo.

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    3. Isis: Eu tenho um viver e um pensar totalmente diferente da minha tia A. Ela crê em Deus e tem uma fé inabalável 'Nele'. Discutimos enormemente esta nossa diferença. Eu sou ateia e não arredo.
      Não gosto de padres e nem de beatas, e nem tão-pouco do fraco argumento e interpretação da história da Igreja que a toda a hora se desfaz em cacos com Papas progressistas e modernistas.
      A minha mente é fechada nesse campo e a da minha tia A. é igualmente fechada.
      Não sei se me faço entender neste pornto e até sei que vais dizer que uma coisa nada tem a ver com outra, porque nós toleramos os cristãos e os ateus.
      Mas os nacionalistas que ai andam agora em manifestações mataram um negro no Bairro Alto, não foi?, lembraste, devias ser miúda ou jovem quando isso aconteceu. Eram portugueses cabeçudos e deficientes mentais que ceifaram uma vida pela cor da pele. As comunidade negras em Portugal arrependeram-se de ter vindo? Talvez a mãe dquele miuda se tenha arrependido. veio para ter paz e mataram-lhe o filho.
      Talvez assim seja mais fácil entender.
      Mas eu percebo o teu receio, mas julgo que ele poderá estar mais 'aceso' pelas notícias que teimam em veicular e que na maioria são xenófobas e sem sentido.
      Eu ontem ao ver aqueles coitados, à chuva, a levar bastonada, as crianças a chorar, eu até chorei.
      Eu não posso acreditar que tratem aqueles miseráveis que atravessaram um oceano num barquinho de borracha para salvar a vida, que não têm nada, daquela maneira.
      Eu não posso ver aquilo. Não posso.
      Isis, salvar uma vida, só por si, é salvar toda a Humanidade.
      Mas entendo-te. Muito.

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    4. Cara Uva, lembro-me muito bem do caso do Bairro Alto e (infelizmente) de tantos outros parecidos. Apenas lamento que afinal tenhamos tantas condições para salvar vidas de fora e não as consigamos arranjar para salvar as de dentro.
      Não sou fundamentalista, em nada aliás, e respeito acima de tudo a opinião contrária à minha tão válida como outra qualquer.... concordo que se deve fazer o possivel para ajudar estes (e outros) casos mas não contem comigo para manifestações de solidariedade (tal como não contam se for contra)
      Tu que gostas tanto de livros, recomendo (caso não tenhas lido ainda) uma trilogia veridica baseada na vida da realeza da Arábia Saudita, que aborda acima de tudo a condição da mulher nesta sociedade mas atravês do qual é retratada o fundamentalismo da religião e outros que, em casos de realeza com tanto conhecimento e acesso a outras culturas não se altera, pode parecer não ter nada a ver mas penso que lendo se entenderá bastante melhor a visão deles em relação ao resto do mundo. O meu receio é que aqueles que com tanta convicção defendem o seu ponto de vista não se adaptem a outra cultura e.... depois mandamo-los embora de volta em barquinhos de borracha??
      Ah... os livros são "Sultana - a Vida Secreta das Princesas Árabes", "As filhas da Princesa Sultana" e "Princesa Sultana - Sua vida, sua história" :)

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  2. Aqui há uns tempos tive um vizinho marroquino!
    O rapaz, que não era de todo mau rapaz, antes pelo contrario, não deixava de ser muçulmano!
    Dava-se extraordinariamente bem com a minha mãe e, na ausência da sua, procurava a minha para lhe dar conselhos!
    A minha mãe respondia-lhe o que podia, mas dizia-lhe que não lhe podia dizer muita coisa, uma vez que aquilo em que acreditava e a vida que levava não era comparável!
    Mas houve três ocasiões que foram interessantes...

    ...a primeira teve a ver com o Ramadão!
    O rapaz trabalhava numa fabrica de mármores, trabalho bem pesado! Durante o Ramadão começou a enfraquecer bastante até que um dia veio para casa mais cedo, fraco, depois de ter desmaiado no trabalho! E levou um raspanete da Srª minha mãe!
    "Então está a fazer um trabalho desses e não come nada durante o dia? Está à espera de quê?"
    "Mas são os meus costumes..." dizia ele!
    "Pois mas quem os fez não andava a carregar pedras às costas o dia todo, de certeza, senão não se lembrava de tal coisa!"
    Aquilo não caiu em saco roto! Ele passou a comer qualquer coisa ao meio do dia e nunca mais teve problemas nem voltou a desmair no local de trabalho!

    Noutra ocasião criticou a minha mão por estar a assar carne de porco! A minha mãe virou-se para ele e respondeu:
    "O que perde as pessoas não é o que põe da boca para dentro, mas sim o que sai da boca para fora!"
    O rapaz ficou a olhar para ela, abananado! Dias depois deu-se ao trabalho de provar uma costeleta grelhada, muito bem passada, e que eu saiba nunca mais olhou para trás!

    Mas a coisa mais curiosa foi quando se juntou com uma Ucraniana! Ora a Ucraniana, jovem, bonita e de cabeça completamente desempoeirada, apesar de se juntar com ele continuou a usar as suas mini-saias, a usar a sua maquilhagem, e continuou a pensar pela sua cabeça! Ele não gostava, havia discussões permanentes entre os dois, ao ponto de a rapariga estar prestes a perder a paciência com ele! E lá vem ele falar com a minha mãe, sem saber o que fazer, porque gostava dela, mas ela não fazia o que ele dizia que ela tinha de fazer...

    ...e a minha mãe respondeu-lhe que ele não estava em Marrocos! Que lá porque na terra dele retiravam o cérebro às raparigas quando nascem, isso não é a norma no resto do mundo! Que ele tinha duas hipoteses: ou procurava alguém que pensasse como ele ou, se gostava mesmo dela, respeitava-a sem a tentar mudar, porque ela fez o mesmo e nunca lhe exigiu que ele mudasse para estar com ela!

    Já lá vão uns 15 anos desde que isto se passou e continuam juntos! E ela continua a usar maquilhagem e mini saias!

    Há estúpidos em todo o lado! Aliás, o que se vê nas redes sociais é, normalmente, os mais estúpidos dos mais estúpidos! E depois, logicamente, toma-se a parte pelo todo, infelizmente!
    Que venha quem vier por bem! E quem não vier por bem, a porta da rua é serventia da casa! Tudo o resto é só barulho e não leva a lado nenhum!
    E aos que estão tão incomodados com a vinda dos refugiados: Não é preciso virem os refugiados para cá! Já passaram pelo Martim Moniz?

    :)

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    1. Clap clap clap à tua Mãe!! E depois a ti! Muito obrigada por esta enriquecedora partilha!

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    2. Também quero deixar um abraço a C. N. Gil por este comentário. É bom conhecer estas histórias que, a meu ver, salvam vidas.

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    3. Pois, a Srª Minha mãe, com os seus 83 anos e a sua fervorosa vivência católica tem uma cabeça muito mais aberta que muito jovem que anda por ai, porque para viver a fé dela tem de ser tolerante, mesmo quando isso é difícil! Mas não é uma tolerância cega...
      ...ainda assim não deixa de ser preocupante a ideia de que algumas mentes que vêem agora não se consigam adaptar ou, pior, queiram antes que nos adaptemos a eles! Mas a nossa vantagem são 500 anos de história em que já levámos com gente de todas as raças e credos imaginários e isso dá-nos uma bagagem que a maior parte dos povos não têm, mesmo os que como nós foram colonizadores!

      Obrigado :)

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    4. Excelente o que a sua mãe fez, felizmente o rapaz ouviu os argumentos. Mas vamos supor que o jovem tinha a mãe e restante família, será que ouviria da mesma forma os conselhos de outras pessoas? Pois é...

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  3. Excelente post, Uva. Por acaso também me tenho lembrado do Aristides de Sousa Mendes.
    Isto: "...infinita sorte e misericórdia de podermos viver num país que se pode dar ao luxo de receber refugiados de guerra" é para emoldurar.
    (e boas pedaladas dia 20)

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  4. Grande historia, C.N. Gil, a sua mae e um excelente ser humano :)

    https://matildeferreira.co.uk/

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    1. Eu também acho, mas a minha opinião não é, como calculas, de todo imparcial...

      LOL

      Obrigado

      :)

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