30 de abril de 2016
E o que eu gosto de árvores?
A maior parte das fotos do meu telemóvel são árvores.
Esta fica por detrás da nova igreja do Santuário de Fátima, e hoje estava particularmente bonita.
Hoje acordei #4
Hoje acordei e lembrei-me da noite de ontem.
Acordar e fugir-me o pensamento para a noite anterior acontecia muito, quando era mais nova. Num sobressalto acordava e pensava: ai meu Deus! não me lembro nada!
O que se passou ontem de noite, perguntam-me os sequiosos leitores, foi uma coisa mais ou menos assim:
Fui mais uma vez apanhada nas malhas do dever cívico e social, e quando dei conta já estava num 4ª andar das Avenidas Novas a dar uni-beijocas nas senhoras da Comissão.
Era a mais nova em pelo menos 35 anos. Desproporcional na idade (e na altura), entrei muito corada numa casa ao melhor estilo Luís XV.
Receberam-me todas à porta, muito alegres, com ar de muitos anos de narizes enfiados nos livros, os cabelos impecavelmente penteados, as melenas muito loiras, os óculos de ver ao perto pendurados nos peitilhos, e o brilho suspeito dos olhos, pejados de lentes intra-oculares colocadas na Torres de Lisboa.
Eu percebo a bagunça que fazem os miúdos. O barulho, a desordem, o lixo e as quantidades industriais de mijunça que deixam nos cantos do jardim; eu entendo as senhoras, cansadas, depois de muitos anos de vida, verem-se enleadas no meio da infernal juventude que se junta para crescer, e encher dos cálices torpes da vida.
E agora vejo-me ali, e aqui, cá e lá, e percebo que afinal é isto, a inexorável passagem do tempo.
Ali sentada, num 4ª andar das Avenidas Novas, repenicando sorrisos às senhoras da Comissão, senti-me como se acordasse de repente e me fugisse o pensamento para a noite anterior, quando era (mais) nova, e num sobressalto acordasse, e pensasse: ai meu Deus! ainda me lembro de tudo!
Acordar e fugir-me o pensamento para a noite anterior acontecia muito, quando era mais nova. Num sobressalto acordava e pensava: ai meu Deus! não me lembro nada!
O que se passou ontem de noite, perguntam-me os sequiosos leitores, foi uma coisa mais ou menos assim:
Fui mais uma vez apanhada nas malhas do dever cívico e social, e quando dei conta já estava num 4ª andar das Avenidas Novas a dar uni-beijocas nas senhoras da Comissão.
Era a mais nova em pelo menos 35 anos. Desproporcional na idade (e na altura), entrei muito corada numa casa ao melhor estilo Luís XV.
Receberam-me todas à porta, muito alegres, com ar de muitos anos de narizes enfiados nos livros, os cabelos impecavelmente penteados, as melenas muito loiras, os óculos de ver ao perto pendurados nos peitilhos, e o brilho suspeito dos olhos, pejados de lentes intra-oculares colocadas na Torres de Lisboa.
Eu percebo a bagunça que fazem os miúdos. O barulho, a desordem, o lixo e as quantidades industriais de mijunça que deixam nos cantos do jardim; eu entendo as senhoras, cansadas, depois de muitos anos de vida, verem-se enleadas no meio da infernal juventude que se junta para crescer, e encher dos cálices torpes da vida.
E agora vejo-me ali, e aqui, cá e lá, e percebo que afinal é isto, a inexorável passagem do tempo.
Ali sentada, num 4ª andar das Avenidas Novas, repenicando sorrisos às senhoras da Comissão, senti-me como se acordasse de repente e me fugisse o pensamento para a noite anterior, quando era (mais) nova, e num sobressalto acordasse, e pensasse: ai meu Deus! ainda me lembro de tudo!
29 de abril de 2016
Eu hoje acordei #3
Pá, esta miúda dá-me vontade de a lamber.
Porquê? Porque sim.
Em tempos idos, ainda a Filipa não era a minha PC [Personal Cabeleireira] e quando eu ainda não usava permanente, fui obrigada a usar um champô de alcatrão para me secar a oleosidade do cabelo e dar-lhe um pouco mais de volume. Quem me conhece sabe aquilo que passei, sobretudo porque quando entrava no recinto escolar era como se fosse Moisés a atravessar o Mar Vermelho. Aquilo era um pivete tal que as pessoas se afastavam todas, com as mãos a tapar os narizes.
Mas eu hoje deixei para trás todo um passado de desgraças, e saí de casa (pela primeira vez) com o cabelo por cima das orelhas, topem bem, por cima das orelhas, depois de experimentar um dos mais maravilhosos produtos de que há memória!!
(A paciência que tu dedicas à minha beleza, fez-me acordar Rococó).
28 de abril de 2016
Hoje acordei #2
Ontem, quando saí
da boca do metro, e eu quando saio da boca do metro saio diretamente para um recreio gigante, para uma nursery school apinhada de borbulhas com miúdos na cara, vinha tão apanhada das ideias, tão acabrunhada, tão metida para dentro, que fui bater com o ombro direito no semáforo da Vilhena. Capaz de
arrancar um braço!
Encontrei duas chavalas a fumar sentadas no pial do barbeiro, e pareceu-me que tinham ambas as calças ao contrário. O cós muito subido e a perna a meia canela. Pensei em mim com aquela idade. Magríssima, com uns ténis sem cor definida, e sem pensamentos ambíguos na cabeça. As decisões da vida eram apenas duas: Bairro Alto ou Cai'Sodré. Fumo continuo ou em bolinhas. Imperial ou Coca Cola.
A minha vida por dentro está Tiririca.
Mais balançada do que está não fica.
Encontrei duas chavalas a fumar sentadas no pial do barbeiro, e pareceu-me que tinham ambas as calças ao contrário. O cós muito subido e a perna a meia canela. Pensei em mim com aquela idade. Magríssima, com uns ténis sem cor definida, e sem pensamentos ambíguos na cabeça. As decisões da vida eram apenas duas: Bairro Alto ou Cai'Sodré. Fumo continuo ou em bolinhas. Imperial ou Coca Cola.
A minha vida por dentro está Tiririca.
Mais balançada do que está não fica.
Hoje acordei #1
Ontem estive aqui duas ou três vezes.
Visitei a minha malta e toda a gente se apresentou impecável, com posts cheios de ironia (como eu gosto), o Lago (Tanga)nica continuava a arder, a Loira acabava de superar mais um desafio com um alforge mais pesado que um presunto, Mirone (e muito bem) considerou confrangedor (e eu também) as pessoas que nos confrangem com coisas confrangentes, Palmier, muito desanimada e ainda assim consegue ser a que mais nos anima, o C.N Gil apresentou-nos uma gaja de mamas ao léu a fazer-nos lembrar (o que é confrangedor) nós com aquela idade, enfim, toda a gente muito entretida com assuntos interessantes, e eu, que aqui vim duas ou três vezes para escrever uma cena qualquer, que não sei exatamente o quê; ainda pensei naquilo do Palácio do Cais do Sodré, ou na besta que atirou o cão de uma ponte, mas nada me captou tanto a atenção, e ainda estou um nadinha circunspecta, a fazer aquela boquinha à blogger, com a nova publicidade ao detergente Skip, que vi num blog dessas coisas.
Estou absolutamente confrangida, porque há por aí tanta gente, caramba, mas tanta gente capaz, gente profissional, criativa, brilhante!! gente que sabe escrever!! que saber fazer, que sabe exatamente o que significa publicidade, e depois o que vejo é uma UniLever displicente, a marimbar completamente para o públic(uzinho) alvo, a entregar os pontos, só naquela do faz lá aí uma porcaria qualquer que o que interessa é aparecer, e entrega a publicidade da sua marca, do seu melhor produto, a pessoas que escrevem kilos de roupa.
Visitei a minha malta e toda a gente se apresentou impecável, com posts cheios de ironia (como eu gosto), o Lago (Tanga)nica continuava a arder, a Loira acabava de superar mais um desafio com um alforge mais pesado que um presunto, Mirone (e muito bem) considerou confrangedor (e eu também) as pessoas que nos confrangem com coisas confrangentes, Palmier, muito desanimada e ainda assim consegue ser a que mais nos anima, o C.N Gil apresentou-nos uma gaja de mamas ao léu a fazer-nos lembrar (o que é confrangedor) nós com aquela idade, enfim, toda a gente muito entretida com assuntos interessantes, e eu, que aqui vim duas ou três vezes para escrever uma cena qualquer, que não sei exatamente o quê; ainda pensei naquilo do Palácio do Cais do Sodré, ou na besta que atirou o cão de uma ponte, mas nada me captou tanto a atenção, e ainda estou um nadinha circunspecta, a fazer aquela boquinha à blogger, com a nova publicidade ao detergente Skip, que vi num blog dessas coisas.
Estou absolutamente confrangida, porque há por aí tanta gente, caramba, mas tanta gente capaz, gente profissional, criativa, brilhante!! gente que sabe escrever!! que saber fazer, que sabe exatamente o que significa publicidade, e depois o que vejo é uma UniLever displicente, a marimbar completamente para o públic(uzinho) alvo, a entregar os pontos, só naquela do faz lá aí uma porcaria qualquer que o que interessa é aparecer, e entrega a publicidade da sua marca, do seu melhor produto, a pessoas que escrevem kilos de roupa.
26 de abril de 2016
Ontem, 25 de Abril
Mesmo em nome do bem comum, da Liberdade de uma nação, haverá sempre Ambrósios, com saudades do Salazar.
24 de abril de 2016
23 de abril de 2016
O que vês da tua varanda?
22 de abril de 2016
Da genialidade
Há um psiquiatra, pedopsiquiatra e psicanalista que eu muito admiro, porque é um génio.
Eu, ao contrário daquelas pessoas que se perdem de amores pelos seres mais belos, mais puros ou mais cómicos, sou uma apaixonada por génios. Se há um génio cómico, se há um génio puro, ou se há um génio belo, também os admiro, mas para mim a genialidade deve ultrapassar a barreira da especialização ou o pendor profissional da genialidade. Não concordo com o engrandecimento de determinado ser humano, se à partida se mostra incapaz de dar frutos, acaso o enxertem noutro local.
Tenho como convicção, e não largo, que quem só sabe de medicina não é bom médico.
Há na Humanidade um grande número de necessidades.
Há necessidades que nos são comuns, prioridades básicas iguais para todos, mas não falo especificamente dessas, falo numa necessidade absoluta, que nos norteia e nos organiza; falo da necessidade de identificar as coisas e de certeiramente, e sem rodeios, lhes dar um nome.
Os génios são aqueles que dão o nome às coisas, que agrupam coisas diferentes que se ligam entre si, e as identificam como uma só.
Na depressão, por exemplo.
A depressão já foi definida e redefinida por inúmeros estudiosos da psiquiatria. A depressão é isto, a depressão é aquilo. Fica deprimido quem faz isto, não faz aquilo. É uma tão grande panóplia de conceitos que a palavra se esboroa e os deprimidos ficam sem saber o que têm.
Mas o Coimbra de Matos, no seu génio usual, esclarece que a depressão acontece sempre quando estamos numa situação em que damos mais afecto do que recebemos.
E ficamos descansados, a depressão volta a reunir-se numa só palavra, e o deprimido procurará perceber, sozinho ou ajudado, onde lhe falta o retorno do afecto que aplica em demasia.
Eu, ao contrário daquelas pessoas que se perdem de amores pelos seres mais belos, mais puros ou mais cómicos, sou uma apaixonada por génios. Se há um génio cómico, se há um génio puro, ou se há um génio belo, também os admiro, mas para mim a genialidade deve ultrapassar a barreira da especialização ou o pendor profissional da genialidade. Não concordo com o engrandecimento de determinado ser humano, se à partida se mostra incapaz de dar frutos, acaso o enxertem noutro local.
Tenho como convicção, e não largo, que quem só sabe de medicina não é bom médico.
Há na Humanidade um grande número de necessidades.
Há necessidades que nos são comuns, prioridades básicas iguais para todos, mas não falo especificamente dessas, falo numa necessidade absoluta, que nos norteia e nos organiza; falo da necessidade de identificar as coisas e de certeiramente, e sem rodeios, lhes dar um nome.
Os génios são aqueles que dão o nome às coisas, que agrupam coisas diferentes que se ligam entre si, e as identificam como uma só.
Na depressão, por exemplo.
A depressão já foi definida e redefinida por inúmeros estudiosos da psiquiatria. A depressão é isto, a depressão é aquilo. Fica deprimido quem faz isto, não faz aquilo. É uma tão grande panóplia de conceitos que a palavra se esboroa e os deprimidos ficam sem saber o que têm.
Mas o Coimbra de Matos, no seu génio usual, esclarece que a depressão acontece sempre quando estamos numa situação em que damos mais afecto do que recebemos.
E ficamos descansados, a depressão volta a reunir-se numa só palavra, e o deprimido procurará perceber, sozinho ou ajudado, onde lhe falta o retorno do afecto que aplica em demasia.
21 de abril de 2016
Rule of Law
Apareceu-me de bigode posto, numa cara bronzeada.
Nunca imaginei que naquela cara imberbe lhe pudessem nascer sorrisos, quanto mais um trabalhoso bigode. E riu-se quando me viu porque, justamente, lhe gabei a farfalha e fiquei contente de o ver.
- Está cá? Não me diga que voltou para Lisboa?
- Não, nem pensar. Está muito frio em Lisboa.
- Entre, entre, deixe-me olhar para si. O que o sol faz a uma pessoa!
- Estão em trabalhos? Está tudo de pernas para o ar aqui na rua. Que caos.
- É verdade, estão a remodelar em simultâneo dois hotéis, e um edifício para inquilinos de luxo.
- Não, não falo desses trabalhos. Refiro-me ali do fundo da rua. Aquilo está cheio de gente, televisão e polícias. Há ali algum escritório de advogados?
Nunca imaginei que naquela cara imberbe lhe pudessem nascer sorrisos, quanto mais um trabalhoso bigode. E riu-se quando me viu porque, justamente, lhe gabei a farfalha e fiquei contente de o ver.
- Está cá? Não me diga que voltou para Lisboa?
- Não, nem pensar. Está muito frio em Lisboa.
- Entre, entre, deixe-me olhar para si. O que o sol faz a uma pessoa!
- Estão em trabalhos? Está tudo de pernas para o ar aqui na rua. Que caos.
- É verdade, estão a remodelar em simultâneo dois hotéis, e um edifício para inquilinos de luxo.
- Não, não falo desses trabalhos. Refiro-me ali do fundo da rua. Aquilo está cheio de gente, televisão e polícias. Há ali algum escritório de advogados?
20 de abril de 2016
E tu Uva, também te estás a preparar para o dia mundial do livro?
Of course!
Today I've started spending all the money I saved to go on holiday, in some English literature.
I don't want to spend the World Book Day (WBD) in a multicultural city like Lisbon without buying something of Shakespeare.
Com a ajuda sempre amiga do: http://tradukka.com
Eu sou uma blogger de renome! Eu não posso andar por aí a escrever posts sem ser no mínimo trilingue! Andei uma porrada de tempo a juntar dinheiro para fazer um curso, mas como sou uma atrasada mental, gastei-o para comprar uma bicicleta a pedais. Agora tenho de estudar inglês sozinha, em livros de exercícios para crianças, e ainda por cima do agoirento do Murphy.
E toda a gente conhece o sacana do Murphy.
Quando é para correr mal, corre mesmo mal.
19 de abril de 2016
Azougue
Há muitos anos atrás, quando éramos felizes sem saber, pôs-se um assunto à mesa que nunca mais me esqueci. Importava aferir, e todas tiveram a palavra, o que seriam as miúdas quando fossem crescidas. A mais velha, que nunca saiu de casa até perfazer os 13 anos, miúda responsável que sabia fazer tudo numa casa, disse logo de chofre que a mana não serviria para nada. Era gorda e metia os joelhos para dentro. Ó mãe, olha a mana! A mãe, uma senhora pequenina de sorriso muito aberto, que cozinhava ao fogão sempre com a Rua da Palma na boca, zangou-se. Eu, que não tinha manas para me azucrinarem a cabeça, divertia-me com aquela disputa constante que opunha a idade de uma, à graça da outra. A menina do meio, que teve sempre a virtude (e o recheio), por ser a mais bonita, era em tudo pior que a mais velha; isto se o termo de comparação fossem as lides da casa ou os estudos, que levávamos todas na mesma escola. As mães, na sua velada disputa entre as herdeiras, defendiam uma e outra, mas nunca a sua. A tua mais velha tem mais jeito que a minha, que não me sabe fazer nada. A dela era eu, e a sentença estava lida. Não digas isso rapariga. A tua é a mais nova, e olha que se lhe passar o azougue, faz-se uma bela moça. A mais velha, dona de uma alegria de nota alta, ria-se com uns dentes muito brancos. Só se for para Guia Turística, a correr de um lado para o outro, a mostrar os monumentos aos bifes. Eu, com as mãozinhas escondidas por baixo da mesa, fazia-lhe asneiredos com os dedos. Ó mãe, olha ela!
As cinco à mesa, riamos a bandeiras despregadas com o futuro incerto, que era o nosso. Eu, a mais diabólica, serviria para Guia Turística porque era muito extrovertida, ficava embasbacada em frente a qualquer obra de arte, e falava como cantam as cigarras, sem parar.
Nunca nenhuma, em todas as profissões que me foram atribuídas naquela mesa, e foram muitas ao longo dos anos, foi tão acertada como aquela, a de Guia Turística.
Se tivesse dado ouvidos ao oráculo familiar, não estaria aqui hoje, onde estou, com o rabinho muito apertado e o coração claudicante, por razões de um tal teste de inglês, que fazem certas empresas às secretárias, que diabólicas, não lhes passa o azougue.
As cinco à mesa, riamos a bandeiras despregadas com o futuro incerto, que era o nosso. Eu, a mais diabólica, serviria para Guia Turística porque era muito extrovertida, ficava embasbacada em frente a qualquer obra de arte, e falava como cantam as cigarras, sem parar.
Nunca nenhuma, em todas as profissões que me foram atribuídas naquela mesa, e foram muitas ao longo dos anos, foi tão acertada como aquela, a de Guia Turística.
Se tivesse dado ouvidos ao oráculo familiar, não estaria aqui hoje, onde estou, com o rabinho muito apertado e o coração claudicante, por razões de um tal teste de inglês, que fazem certas empresas às secretárias, que diabólicas, não lhes passa o azougue.
18 de abril de 2016
Das porras
Eu tenho porras.
Esta é, em primeira (e última) análise, o que a maioria das pessoas que me conhecem de perto pensam a meu respeito.
Estas pessoas são preciosas e eu gosto muito que façam parte da minha vida, mesmo que a meu respeito tenham opiniões tão singulares.
Eu tenho porras, que tenho, e algumas bem malinas, ou malinosas, como também dizem que sou, mas não medram no meu coração, não ficam o tempo suficiente para ganhar raízes, não me azedam o dia seguinte porque, e é aqui que eu quero chegar, uma das minhas principais porras é a de estar sempre pronta para começar a vida. E isto sim, é muito singular e precioso.
Esta capacidade de me refazer rapidamente do dia que passa, e abro aqui um parêntesis para segredar que esta porra foi um dos principais motes para o nome do blog, de apanhar os cacos todos do chão e conseguir perceber - sei lá como é que eu faço isto - se posso colá-los outra vez, ou se pelo contrário não vale a pena continuar a matar a sede num copo estalado, é uma porra difícil de explicar aos outros.
Por isso é que é uma porra explicar a certas pessoas, ou a incertas pessoas, que não vale a pena a pena que têm quando deixo tudo para trás, a casa, o bairro, uma amiga muito chegada, um emprego de topo de carreira, um certo penteado. Se assim o fiz foi porque os cacos espalhados pelo chão, pontiagudos e perigosos, não me deixavam avançar.
E é uma porra esta porra que tenho, de estar sempre pronta para começar a vida.
Todos os dias.
17 de abril de 2016
Dos ecos das minhas palavras
Continuam a chegar-me de todos os lados, e que alegria, os ecos do que escrevo.
Ontem cheguei às 400 mil visitas, e acaso não tivesse o retorno daquilo que escrevo, das coisas que conto, dos delírios que tenho, julgo que o melhor seria meter a minha viola no saco, e remeter-me ao silêncio das minhas palavras.
Lembro-me de todas as pessoas que por aqui passaram, lembro-me de ter aprendido à minha custa as regras deste jogo, tão complexas.
Sei, porque já vivi o suficiente, que podemos ser muito felizes - se nos ligarmos às palavras e às pessoas que nos lêem as palavras - através dos afetos. Sei, porque já vivi o suficiente, que se nunca nos curvarmos perante uma evidência, um erro, somos a soberba rancorosa, remoemos a raiva negra, e isso nota-se por fora.
Tenho um respeito absoluto por todos os que escrevem, por todos os que transmitem o amor pelas letras, pelos livros, pela poesia, e que se dedicam com uma atenção especial à arte tão grandiosa que é esta, de entreter, fazer pensar, fazer sentir, repercutir, nos outros, o impacto das nossas letras.
Todos os amigos imaginários que tenho através do blog têm um peso real na minha vida.
Imagino-os todos os dias, com as suas carinhas iluminadas pela luz do monitor, à noite, depois da vida arrumada, dos trabalhos deitados, escrevendo para mim, contando-me, preocupados que estão em não deixar de me atender. Eu penso que escrevem para mim, claro, por força das vezes, tantas, que me identifico com o que escrevem. E sei quem me escreve à noite, sei quem me escreve pela manhã, e sei quem anda apoquentado, distraído, zangado, também comigo.
Somos, cada um à sua maneira, todos iguais.
É por isto que aqui vamos continuando, não por nós, mas uns pelos outros, ligados por finas ironias, por grandes confusões, por mal entendidos, por amizade, por admiração.
Cá vamos escrevendo e tecendo, vivendo e remoendo, reparando estragos, apanhando os cacos, sedentos que estamos todos de nos manter-mos assim, para sempre, ligados.
Continuam a chegar-me de todos os lados os ecos do que escrevo.
Peço desculpa, porque sou a Uva Passa, por algumas frases menos conseguidas, menos buriladas, sobretudo pela (minha) presunção ruinosa de que todos me entendem da mesma forma, me conhecem os contornos, me sabem as ironias.
Confesso-me: isto às vezes, como diz a menina azul, é tudo uma grande metáfora.
Obrigada a todos os que passam pela Uva Passa.
Obrigada.
Ontem cheguei às 400 mil visitas, e acaso não tivesse o retorno daquilo que escrevo, das coisas que conto, dos delírios que tenho, julgo que o melhor seria meter a minha viola no saco, e remeter-me ao silêncio das minhas palavras.
Lembro-me de todas as pessoas que por aqui passaram, lembro-me de ter aprendido à minha custa as regras deste jogo, tão complexas.
Sei, porque já vivi o suficiente, que podemos ser muito felizes - se nos ligarmos às palavras e às pessoas que nos lêem as palavras - através dos afetos. Sei, porque já vivi o suficiente, que se nunca nos curvarmos perante uma evidência, um erro, somos a soberba rancorosa, remoemos a raiva negra, e isso nota-se por fora.
Tenho um respeito absoluto por todos os que escrevem, por todos os que transmitem o amor pelas letras, pelos livros, pela poesia, e que se dedicam com uma atenção especial à arte tão grandiosa que é esta, de entreter, fazer pensar, fazer sentir, repercutir, nos outros, o impacto das nossas letras.
Todos os amigos imaginários que tenho através do blog têm um peso real na minha vida.
Imagino-os todos os dias, com as suas carinhas iluminadas pela luz do monitor, à noite, depois da vida arrumada, dos trabalhos deitados, escrevendo para mim, contando-me, preocupados que estão em não deixar de me atender. Eu penso que escrevem para mim, claro, por força das vezes, tantas, que me identifico com o que escrevem. E sei quem me escreve à noite, sei quem me escreve pela manhã, e sei quem anda apoquentado, distraído, zangado, também comigo.
Somos, cada um à sua maneira, todos iguais.
É por isto que aqui vamos continuando, não por nós, mas uns pelos outros, ligados por finas ironias, por grandes confusões, por mal entendidos, por amizade, por admiração.
Cá vamos escrevendo e tecendo, vivendo e remoendo, reparando estragos, apanhando os cacos, sedentos que estamos todos de nos manter-mos assim, para sempre, ligados.
Continuam a chegar-me de todos os lados os ecos do que escrevo.
Confesso-me: isto às vezes, como diz a menina azul, é tudo uma grande metáfora.
Obrigada a todos os que passam pela Uva Passa.
Obrigada.
15 de abril de 2016
Chamem a polícia
Tentando o simulacro da comparação metafórica, que não sei a esta distância do final do post se correrá bem, surge-me à ideia a última vez que escrevi neste blog - que foi ontem - e a primeira vez que entrei numa esquadra da PSP para reportar uma ocorrência - que foi hoje.
Faço esta comparação porque aquilo que eu sinto ao entrar no meu blog por estes dias é, metaforicamente, aquilo que senti ao entrar hoje na PSP.
Depois de um longo namoro comigo própria, em que abria um qualquer livro da minha estante e me achava capaz de escrever aquilo, e juro-vos, a soberba era tanta que me voltava na cadeira rotativa do escritório, acertava o olho num livro ao calhas - podia ser Dostoievski, podia ser qualquer um -, e dizia para mim própria que se abrisse um blog e treinasse o suficiente, o bastante, acabaria por alcançar certos pódios, e que através da minha escrita, muito boa, e do meu género, muito bom, outros se virariam para a estante, para si e para dentro, e iniciariam a mesmíssima aventura das letras.
Achei-me capaz de arrastar massas, ouve até, mais tarde, quem me dissesse que faria história, que seria grande, mas a verdade é que há pódios que não se alcançam, mesmo que cortemos todas as metas.
Hoje, por coisas cá da minha vida, entrei pela primeira vez numa esquadra da PSP para reportar um crime. Tal como lá atrás me julguei capaz de tudo, ali, num hall pejado de moscas, mostrei-me capaz de nada. Reconheci o logótipo azul, sei do que ali se trata, sei o que ali se faz.
Sei também, que tal como no blog, há ali dias menos bons, há dias francamente maus, há dias banais, há dias sentimentais, e há dias em que são apenas como as moscas que andam à roda na minha cabeça.
Acho que hoje, quando me sentei na cadeira de napa preta, e olhei o guiché do Chefe Ramos, é que percebi a ironia da metáfora.
Fui tomada de assalto por força de um assalto.
Reconheço o meu logótipo, sei do que se trata, e o que aqui se faz. Sei, tal como na esquadra, que há dias menos bons, há dias francamente maus, há dias banais, e há dias sentimentais.
Mas nenhum dia foi como hoje.
Chamem a polícia.
Tenho as palavras presas.
Faço esta comparação porque aquilo que eu sinto ao entrar no meu blog por estes dias é, metaforicamente, aquilo que senti ao entrar hoje na PSP.
Depois de um longo namoro comigo própria, em que abria um qualquer livro da minha estante e me achava capaz de escrever aquilo, e juro-vos, a soberba era tanta que me voltava na cadeira rotativa do escritório, acertava o olho num livro ao calhas - podia ser Dostoievski, podia ser qualquer um -, e dizia para mim própria que se abrisse um blog e treinasse o suficiente, o bastante, acabaria por alcançar certos pódios, e que através da minha escrita, muito boa, e do meu género, muito bom, outros se virariam para a estante, para si e para dentro, e iniciariam a mesmíssima aventura das letras.
Achei-me capaz de arrastar massas, ouve até, mais tarde, quem me dissesse que faria história, que seria grande, mas a verdade é que há pódios que não se alcançam, mesmo que cortemos todas as metas.
Hoje, por coisas cá da minha vida, entrei pela primeira vez numa esquadra da PSP para reportar um crime. Tal como lá atrás me julguei capaz de tudo, ali, num hall pejado de moscas, mostrei-me capaz de nada. Reconheci o logótipo azul, sei do que ali se trata, sei o que ali se faz.
Sei também, que tal como no blog, há ali dias menos bons, há dias francamente maus, há dias banais, há dias sentimentais, e há dias em que são apenas como as moscas que andam à roda na minha cabeça.
Acho que hoje, quando me sentei na cadeira de napa preta, e olhei o guiché do Chefe Ramos, é que percebi a ironia da metáfora.
Fui tomada de assalto por força de um assalto.
Reconheço o meu logótipo, sei do que se trata, e o que aqui se faz. Sei, tal como na esquadra, que há dias menos bons, há dias francamente maus, há dias banais, e há dias sentimentais.
Mas nenhum dia foi como hoje.
Chamem a polícia.
Tenho as palavras presas.
13 de abril de 2016
Beija-me que eu gosto
Fiquei a saber há pouco, através de uma notícia veiculada pelo Jornal Público, que o 'Bloco de Esquerda propõe 25 dias de férias para o sector privado.'
Esta notícia traz-me à memória velhas recordações, sobretudo porque a regra de ganhar 3 dias de férias com base na assiduidade (sem faltas ou faltas justificadas) - que foi retirada pelo anterior governo - era praticamente impossível de conseguir. Havia invariavelmente um dia (ou dois) em que que faltava sem justificação absolutamente nenhuma, além de uma vergonhosa e terrível ressaca.
É, portanto, uma nova proposta, uma proposta de 25 dias, tau!, sem condições.
É pouco mas sabe a ginjas.
Foi também hoje concretizada a ligação do metro de Lisboa à ferrovia; mais uma obra que começou a ser construída durante a gestão desse "grande bicho papão" chamado José Sócrates. O Metro de Lisboa chega à Linha de comboio de Sintra para facilitar a vida às pessoas, permitir as deslocações sem carro, e claro, para descongestionar o trânsito da infernal IC19.
E mais um passo à frente dado pelo energético e socialmente ativo Vasco Morgado, Presidente da Junta de Freguesia de Santo António (Lisboa), com a abertura do supermercado Valor Humano, o primeiro supermercado social de Lisboa. Abre amanhã e enche-me de orgulho saber que afinal ainda há pessoas com gente lá dentro.
Esta notícia traz-me à memória velhas recordações, sobretudo porque a regra de ganhar 3 dias de férias com base na assiduidade (sem faltas ou faltas justificadas) - que foi retirada pelo anterior governo - era praticamente impossível de conseguir. Havia invariavelmente um dia (ou dois) em que que faltava sem justificação absolutamente nenhuma, além de uma vergonhosa e terrível ressaca.
É, portanto, uma nova proposta, uma proposta de 25 dias, tau!, sem condições.
É pouco mas sabe a ginjas.
Foi também hoje concretizada a ligação do metro de Lisboa à ferrovia; mais uma obra que começou a ser construída durante a gestão desse "grande bicho papão" chamado José Sócrates. O Metro de Lisboa chega à Linha de comboio de Sintra para facilitar a vida às pessoas, permitir as deslocações sem carro, e claro, para descongestionar o trânsito da infernal IC19.
E mais um passo à frente dado pelo energético e socialmente ativo Vasco Morgado, Presidente da Junta de Freguesia de Santo António (Lisboa), com a abertura do supermercado Valor Humano, o primeiro supermercado social de Lisboa. Abre amanhã e enche-me de orgulho saber que afinal ainda há pessoas com gente lá dentro.
O Beijo
O Beijo é a melhor coisa que podes fazer com a boca.
Depois, quando metes a língua, ou mostras os dentes, a coisa complica-se.
Posto isto, desta forma, beija, beija somente.
Feliz dia do beijo.
12 de abril de 2016
Não dou para os gastos
Ando sempre metida em avarias.
Passo a vida a aceitar propostas para me juntar a diversos projectos, que vão desde sindicatos a associações de apoio ao carro abandonado na via pública.
Não sei como é que me descobrem, juro, mas já tive cenas cabeludas que não lembram nem ao careca.
Uma vez, estava eu no meu multifacetado escritório, muito sossegada, muito concentrada, a fazer contas para a assembleia geral ordinária de um prédio cheio de pessoas extraordinárias, quando me batem à porta dois senhores muito bem parecidos, cada um com a sua pastinha a dar a dar, e bom dia Dona Uva, soubemos aqui da sua empresa, um nicho de negócio cheio de futuro, somos investidores, temos aqui as pastas para lhe provar, queremos que nos acompanhe na expansão de conceito espanhol do mesmo negócio, mas como loja piloto aqui em Portugal, e assim que abri os olhos já lá estava em Saragoça, a ter formação ao mais alto nível, e aquilo ainda me rendeu uns trocos, alguns anos de trabalho extraordinário, até vender tudo aquela gente, ordinária.
Uma outra vez, escrevi um longo texto para uma publicação qualquer, se não me falha a molécula para uma revista da minha área, sobre jovens delinquentes, e querem lá ver que alguém leu, uau, nunca pensei, e passado uma semana já estava a ser contactada por um iluminatti que queria que eu fosse sócia dele numa clínica quiroprática, no Seixal, porque era uma zona que tinha muitos casos de delinquência e 'famílias descabidas no aspecto social' e ainda fazíamos ali uma parceria interessante.
Tenho em mim todos os sonhos do mundo, e alguns pesadelos também, e lá fui eu à 'clínica'. Aquilo era um balcão branco muito jeitoso, com uma cadeira azul e um telefone, tinha uma marquesa muito sóbria num anexo à parte, e um esqueleto verdadeiro pendurado num cabide que olhava para as pessoas com olhos de peixe.Vi-me grega para me livrar do homem, um poço de ideias pouco práticas, e nunca mais tenciono ir ao Seixal.
Depois, outra vez, mais nova, na fase dos part-time, uma 'pessoa amiga' convidou-me para sócia de um cabeleireiro de uma outra 'pessoa amiga', porque na mesa do café aventei que não me importava de lavar umas cabeças nas férias, que queria mais era arranjar dinheiro para ir não sei onde. Ora a coisa foi rastilhada e dois dias depois tinha a proposta em cima da mesa. Fui lá ver as cabeças, a ver se me agradavam, que ele há cabeças que não interessam nem ao menino jAsus. Ai que trigueirinha que ela é, disse-me a 'pessoa amiga' dona do estabelecimento de lavar cabeças, e venha lá conhecer o espaço que vai adorar, e ai que trigueirinha que ela é.
Não percebi muito bem onde é que se lavavam ali as cabeças, mas percebi que tipo de cabeças ali se lavavam, e não eram as de cima. Um dia escrevo um livro sobre isto e juro que vos mato a rir.
Outra ocasião, que a minha vida são este tipo de coisas, ocasiões, fui convidada para abrir uma mercearia gourmet com produtos da Nigéria por um senhor pequenino que achava que eu assim alta via melhor os clientes, para um restaurante só de iscas e petiscos de fígado de um vizinho da minha avó que se dedicava à apanha da pinha, uma sucursal das alheiras de Alpalhão e queijos de Nisa, uma empresa de revenda de caracóis congelados no verão para vender no inverno, e agora, estava eu novamente aqui, no meu multifacetado escritório, muito sossegada, muito concentrada, a fazer contas à minha vida, que a minha vida é isto, contas, quando plim! recebo um mail muito formal, muito salamaleques, muito altas coisas e tal, a propor-me a presidência de uma associação de moradores, que querem, porque querem, arranjar uma forma de deslocalizar o Instituto Superior Técnico para a Alta de Lisboa, porque os alunos nesse sítio têm mais espaço para vomitar.
Passo a vida a aceitar propostas para me juntar a diversos projectos, que vão desde sindicatos a associações de apoio ao carro abandonado na via pública.
Não sei como é que me descobrem, juro, mas já tive cenas cabeludas que não lembram nem ao careca.
Uma vez, estava eu no meu multifacetado escritório, muito sossegada, muito concentrada, a fazer contas para a assembleia geral ordinária de um prédio cheio de pessoas extraordinárias, quando me batem à porta dois senhores muito bem parecidos, cada um com a sua pastinha a dar a dar, e bom dia Dona Uva, soubemos aqui da sua empresa, um nicho de negócio cheio de futuro, somos investidores, temos aqui as pastas para lhe provar, queremos que nos acompanhe na expansão de conceito espanhol do mesmo negócio, mas como loja piloto aqui em Portugal, e assim que abri os olhos já lá estava em Saragoça, a ter formação ao mais alto nível, e aquilo ainda me rendeu uns trocos, alguns anos de trabalho extraordinário, até vender tudo aquela gente, ordinária.
Uma outra vez, escrevi um longo texto para uma publicação qualquer, se não me falha a molécula para uma revista da minha área, sobre jovens delinquentes, e querem lá ver que alguém leu, uau, nunca pensei, e passado uma semana já estava a ser contactada por um iluminatti que queria que eu fosse sócia dele numa clínica quiroprática, no Seixal, porque era uma zona que tinha muitos casos de delinquência e 'famílias descabidas no aspecto social' e ainda fazíamos ali uma parceria interessante.
Tenho em mim todos os sonhos do mundo, e alguns pesadelos também, e lá fui eu à 'clínica'. Aquilo era um balcão branco muito jeitoso, com uma cadeira azul e um telefone, tinha uma marquesa muito sóbria num anexo à parte, e um esqueleto verdadeiro pendurado num cabide que olhava para as pessoas com olhos de peixe.Vi-me grega para me livrar do homem, um poço de ideias pouco práticas, e nunca mais tenciono ir ao Seixal.
Depois, outra vez, mais nova, na fase dos part-time, uma 'pessoa amiga' convidou-me para sócia de um cabeleireiro de uma outra 'pessoa amiga', porque na mesa do café aventei que não me importava de lavar umas cabeças nas férias, que queria mais era arranjar dinheiro para ir não sei onde. Ora a coisa foi rastilhada e dois dias depois tinha a proposta em cima da mesa. Fui lá ver as cabeças, a ver se me agradavam, que ele há cabeças que não interessam nem ao menino jAsus. Ai que trigueirinha que ela é, disse-me a 'pessoa amiga' dona do estabelecimento de lavar cabeças, e venha lá conhecer o espaço que vai adorar, e ai que trigueirinha que ela é.
Não percebi muito bem onde é que se lavavam ali as cabeças, mas percebi que tipo de cabeças ali se lavavam, e não eram as de cima. Um dia escrevo um livro sobre isto e juro que vos mato a rir.
Outra ocasião, que a minha vida são este tipo de coisas, ocasiões, fui convidada para abrir uma mercearia gourmet com produtos da Nigéria por um senhor pequenino que achava que eu assim alta via melhor os clientes, para um restaurante só de iscas e petiscos de fígado de um vizinho da minha avó que se dedicava à apanha da pinha, uma sucursal das alheiras de Alpalhão e queijos de Nisa, uma empresa de revenda de caracóis congelados no verão para vender no inverno, e agora, estava eu novamente aqui, no meu multifacetado escritório, muito sossegada, muito concentrada, a fazer contas à minha vida, que a minha vida é isto, contas, quando plim! recebo um mail muito formal, muito salamaleques, muito altas coisas e tal, a propor-me a presidência de uma associação de moradores, que querem, porque querem, arranjar uma forma de deslocalizar o Instituto Superior Técnico para a Alta de Lisboa, porque os alunos nesse sítio têm mais espaço para vomitar.
11 de abril de 2016
Adoção - uma forma de vida
Assisti, com redobrada atenção, a mais um caso de retirada de filhos a casais emigrantes portugueses, pelos serviços sociais ingleses.
Lá, no berço do Serviço Social enquanto profissão, os serviços sociais existem, funcionam, e resolvem os problemas sociais de forma totalmente diferente da nossa.
Cá, um pai viola a sua filha durante 12 anos, com o conhecimento da mãe (se calhar a palavra consentimento é muito forte para os leitores mais impressionáveis), e só ao 13º ano, quando a rapariga aparece grávida na consulta de maternidade adolescente é que se levantam as vozes do povo para deliberar (em praça pública, já com os dados pessoais e fotos de todos os intervenientes, que um primo arranjou lá no hospital) se a questão do aborto é para avançar ou não, normalmente com muitos votos a favor do sim, porque o bebé não é culpado e tem direito à vida, mesmo que essa vida seja edificada, ou direi suspensa, em cima de um crime hediondo de violação e maus tratos, cujo estigma e a raiva irão assombrar para sempre aquela criança.
O supremo interesse da criança é deduzido e decidido com base em problemas pessoais que as pessoas têm com o seu Deus e as suas crenças, com aquilo que acham da situação porque conhecem um caso próximo em que ocorreu assim ou assado, e em que metem a sua experiência pessoal a deliberar sobre a vida dos outros.
Numa instância superior, o supremo interesse da criança é condicionado pelo número de vagas nas instituições, pelo dinheiro disponível em projectos educativos, pelo número de profissionais no terreno, e se tudo correr pelo melhor, a criança lá irá à escola até ao 6º ano, e os pais lá andarão mais 3 anos em cursos de formação do IEFP; isto se o pai não der uma facada na mãe, ou não lhe cortar o clitóris com a faca de cortar o bolo dos 25 anos de casamento, ainda a escorrer doce de ovos.
A mãe do bebé de nove dias, já é um acidente diplomático.
Já se investiga uma rede de adoção (que desconheço e não desminto) em que crianças são retiradas aos pais por razões escassas e injustas, para alimentar uma rede fortíssima que impera em Inglaterra de casais estéreis, ou de mães que não gostam de estrias na barriga.
É evidente que dos senhores doutores comentadores que ouvi na televisão, portugueses, nenhum conseguiu ver a realidade que está a menos de um palmo à frente do nariz, cegos que estão com a questão da defesa da nacionalidade da mãe.
Esta mãe, que teve o filho em casa, dentro de uma piscina igual à que a ML levava para a praia com 1 ano, colocada na meio da sala com um marido lá dentro, encheu aquela porcaria nojenta com a água da torneira, e decidiu que era ali, sozinha e sem acompanhamento médico, que iria ter a criança, à boa maneira indígena, na mesma posição que utiliza para cagar.
Entretanto, para que a coisa fosse uma espécie de experiência comercial, lavaram a criança com o produto que vendem na internet para sobreviver, de origem duvidosa, do tipo: "Olhem aqui nós a lavar o nosso próprio filho recém-nascido com este produto. É maravilhoso! Comprem!" e espetaram com as fotografias da mãe naqueles propósitos, dentro da piscina de plástico cheia de água da torneira, com a criança ali, tal como veio ao mundo, nas redes sociais.
A mãe, claro, teve de ser socorrida no hospital e operada de urgência porque o parto deu para o torto, e quando finalmente regressou a casa para junto da sua cobaia nas experiências tribais que levou a cabo, recusou a visita do médico, do enfermeiro e dos serviços sociais, numa nítida afronta ao sistema inglês, ao supremo interesse da criança, e até à ajuda que o Estado Inglês presta a todas as pessoas que vivem no seu país.
Lamento muito mas no berço do Serviço Social as coisas não se resolvem assim, levianamente, com resoluções ad aeternum. As crianças não são retiradas às famílias sem que haja uma razão severa, um estudo rigoroso, uma causa superior.
Infelizmente, e a bloga está pejada de casos destes, há muitas mãe(zinhas) que vendem os seus filhos na internet porque são absolutamente inúteis e incapazes de se sustentarem sozinhas, de se fazerem à vida, de trabalhar.
É que parir a criança no hospital, sem câmaras a filmar o parto e sem a lavagem com o produto da ordem que vendem on-line, era capaz de ser um grande rombo no orçamento.
Lá, no berço do Serviço Social enquanto profissão, os serviços sociais existem, funcionam, e resolvem os problemas sociais de forma totalmente diferente da nossa.
Cá, um pai viola a sua filha durante 12 anos, com o conhecimento da mãe (se calhar a palavra consentimento é muito forte para os leitores mais impressionáveis), e só ao 13º ano, quando a rapariga aparece grávida na consulta de maternidade adolescente é que se levantam as vozes do povo para deliberar (em praça pública, já com os dados pessoais e fotos de todos os intervenientes, que um primo arranjou lá no hospital) se a questão do aborto é para avançar ou não, normalmente com muitos votos a favor do sim, porque o bebé não é culpado e tem direito à vida, mesmo que essa vida seja edificada, ou direi suspensa, em cima de um crime hediondo de violação e maus tratos, cujo estigma e a raiva irão assombrar para sempre aquela criança.
O supremo interesse da criança é deduzido e decidido com base em problemas pessoais que as pessoas têm com o seu Deus e as suas crenças, com aquilo que acham da situação porque conhecem um caso próximo em que ocorreu assim ou assado, e em que metem a sua experiência pessoal a deliberar sobre a vida dos outros.
Numa instância superior, o supremo interesse da criança é condicionado pelo número de vagas nas instituições, pelo dinheiro disponível em projectos educativos, pelo número de profissionais no terreno, e se tudo correr pelo melhor, a criança lá irá à escola até ao 6º ano, e os pais lá andarão mais 3 anos em cursos de formação do IEFP; isto se o pai não der uma facada na mãe, ou não lhe cortar o clitóris com a faca de cortar o bolo dos 25 anos de casamento, ainda a escorrer doce de ovos.
A mãe do bebé de nove dias, já é um acidente diplomático.
Já se investiga uma rede de adoção (que desconheço e não desminto) em que crianças são retiradas aos pais por razões escassas e injustas, para alimentar uma rede fortíssima que impera em Inglaterra de casais estéreis, ou de mães que não gostam de estrias na barriga.
É evidente que dos senhores doutores comentadores que ouvi na televisão, portugueses, nenhum conseguiu ver a realidade que está a menos de um palmo à frente do nariz, cegos que estão com a questão da defesa da nacionalidade da mãe.
Esta mãe, que teve o filho em casa, dentro de uma piscina igual à que a ML levava para a praia com 1 ano, colocada na meio da sala com um marido lá dentro, encheu aquela porcaria nojenta com a água da torneira, e decidiu que era ali, sozinha e sem acompanhamento médico, que iria ter a criança, à boa maneira indígena, na mesma posição que utiliza para cagar.
Entretanto, para que a coisa fosse uma espécie de experiência comercial, lavaram a criança com o produto que vendem na internet para sobreviver, de origem duvidosa, do tipo: "Olhem aqui nós a lavar o nosso próprio filho recém-nascido com este produto. É maravilhoso! Comprem!" e espetaram com as fotografias da mãe naqueles propósitos, dentro da piscina de plástico cheia de água da torneira, com a criança ali, tal como veio ao mundo, nas redes sociais.
A mãe, claro, teve de ser socorrida no hospital e operada de urgência porque o parto deu para o torto, e quando finalmente regressou a casa para junto da sua cobaia nas experiências tribais que levou a cabo, recusou a visita do médico, do enfermeiro e dos serviços sociais, numa nítida afronta ao sistema inglês, ao supremo interesse da criança, e até à ajuda que o Estado Inglês presta a todas as pessoas que vivem no seu país.
Lamento muito mas no berço do Serviço Social as coisas não se resolvem assim, levianamente, com resoluções ad aeternum. As crianças não são retiradas às famílias sem que haja uma razão severa, um estudo rigoroso, uma causa superior.
Infelizmente, e a bloga está pejada de casos destes, há muitas mãe(zinhas) que vendem os seus filhos na internet porque são absolutamente inúteis e incapazes de se sustentarem sozinhas, de se fazerem à vida, de trabalhar.
É que parir a criança no hospital, sem câmaras a filmar o parto e sem a lavagem com o produto da ordem que vendem on-line, era capaz de ser um grande rombo no orçamento.
10 de abril de 2016
8 de abril de 2016
Das bofetadas
Parece-me óbvio que as piores bofetadas são aquelas que recebemos da vida, em silêncio. Sem alardes, sem comentários jocosos ou de pena, ou mesmo alento, no rodapé.
Ao mesmo tempo, e por pura coincidência, a vida, como o João Soares fez com o Seabra, prometeu-me um par de bofetadas, e depois, também por pura coincidência, redimiu-se e pediu-me desculpa pelo grande maremoto que despoletou, pelas águas tão agitadas que me engoliram em ondas, pela dor (e pela vergonha) de ser assim traída, por mim própria.
São as bofetadas prometidas, as que por qualquer razão não se fizeram cumprir, as piores, as que fazem mais estragos.
A presunção destrói a certeza, supomos, como os videntes, que algo se aproxima, está para breve, é certo e ao mesmo tempo intempestivo. Lutamos com fantasmas criados pelo medo, que estão em todo o lado, olhando-nos pelas costas, mas que não estão em lado algum.
A partir de uma suposição, de uma bofetada prometida, cometem-se os piores erros. Na defensiva, como animais acossados, atacamos toda a gente, somos vítimas, somos doentes, estamos à morte.
E a vida passa. E as esplanadas estão cheias. E a primavera desperta.
E nós ali, cheios de frio, de pena, perguntando a tudo e a todos: porquê?
Quando a vida te der limões, só há uma coisa a fazer: olhar bem para aquilo, ver se aquilo são mesmo limões, espremer bem e ver se sai sumo, provar para perceber se é azedo o sumo azedo que deita. Se forem limões, afasta-os, se foram azedos, deita-os fora. Em qualquer dos casos livra-te deles.
Ninguém é obrigado a beber limonadas.
Ninguém é obrigado a sucumbir ao sabor azedo da vida.
Ao mesmo tempo, e por pura coincidência, a vida, como o João Soares fez com o Seabra, prometeu-me um par de bofetadas, e depois, também por pura coincidência, redimiu-se e pediu-me desculpa pelo grande maremoto que despoletou, pelas águas tão agitadas que me engoliram em ondas, pela dor (e pela vergonha) de ser assim traída, por mim própria.
São as bofetadas prometidas, as que por qualquer razão não se fizeram cumprir, as piores, as que fazem mais estragos.
A presunção destrói a certeza, supomos, como os videntes, que algo se aproxima, está para breve, é certo e ao mesmo tempo intempestivo. Lutamos com fantasmas criados pelo medo, que estão em todo o lado, olhando-nos pelas costas, mas que não estão em lado algum.
A partir de uma suposição, de uma bofetada prometida, cometem-se os piores erros. Na defensiva, como animais acossados, atacamos toda a gente, somos vítimas, somos doentes, estamos à morte.
E a vida passa. E as esplanadas estão cheias. E a primavera desperta.
E nós ali, cheios de frio, de pena, perguntando a tudo e a todos: porquê?
Quando a vida te der limões, só há uma coisa a fazer: olhar bem para aquilo, ver se aquilo são mesmo limões, espremer bem e ver se sai sumo, provar para perceber se é azedo o sumo azedo que deita. Se forem limões, afasta-os, se foram azedos, deita-os fora. Em qualquer dos casos livra-te deles.
Ninguém é obrigado a beber limonadas.
Ninguém é obrigado a sucumbir ao sabor azedo da vida.
6 de abril de 2016
Na consulta médica
A minha médica é fantástica.
Digo isto para não ter aqui o anónimo mauzão, fantasma da Uva sempre que fala dos médicos.
Chô.
Dizia eu, a minha médica é fantástica. Preocupou-se comigo, percebeu a coisa, acalmou as hostes, encostou os óculos ao nariz e foi mãos largas nos exames.
Não é costume. Tem medo da inspeção.
Não me sacudiu do gabinete com a desculpa dos 20 utentes para atender até às 11h da manhã, como é apanágio, e perguntou-me, e notei-lhe uma certa pena, se tinha seguro de saúde para aguentar a caterva. Não tenho. Pago 90 euros de consulta pediátrica da ML quando dela necessito, e é o V. que tem essa mordomia. Os homens precisam mais.
Trata-me por tu porque me conhece bem. Desenrasquei-lhe um bom médico para uma utente dela, do país dela, sem papéis, sem nada, que se viu em palpos de aranha com uma coisa mal feita. À época, e em desespero de causa, olhou para mim e achou-me com cara de Assistente Social. Já não sou e nem era, mas tenho cá os meus contactos. Os médicos são pessoas como nós.
Nestes anos todos que foram poucos, ela fez por mim aquilo que é natural os médicos fazerem: receitou-me um medicamento milagroso que custa 3 euros na farmácia (sem receita médica), depois de anos sem fim a aturar um médico que me ignorou as maleitas e me receitava placebo.
Eu andava desde os 25 anos a triptanos, e antes disso chegava a comer 17 comprimidos para manter a minha cabeça fora da lista de mártires. Se não explodiu até agora, a ela lho devo.
Andei um ror de estações de metro para chegar ao Centro de Saúde. Já não estou habituada. Dezembro já vai longe. Mas a minha médica, que é fantástica, deu-me um ótimo conselho:
- Onde vais fazer estes exames?
- Não sei, talvez em Lisboa. Mudei-me para lá.
- Mudaste??!! Ahh vai lá, vai lá. E mudas também de médico, ficas mais perto.
- Mas se já nos conhecemos...
- Não! Muda, muda, que eu já tenho 2 000 utentes.
Vou ter saudades disto.
Digo isto para não ter aqui o anónimo mauzão, fantasma da Uva sempre que fala dos médicos.
Chô.
Dizia eu, a minha médica é fantástica. Preocupou-se comigo, percebeu a coisa, acalmou as hostes, encostou os óculos ao nariz e foi mãos largas nos exames.
Não é costume. Tem medo da inspeção.
Não me sacudiu do gabinete com a desculpa dos 20 utentes para atender até às 11h da manhã, como é apanágio, e perguntou-me, e notei-lhe uma certa pena, se tinha seguro de saúde para aguentar a caterva. Não tenho. Pago 90 euros de consulta pediátrica da ML quando dela necessito, e é o V. que tem essa mordomia. Os homens precisam mais.
Trata-me por tu porque me conhece bem. Desenrasquei-lhe um bom médico para uma utente dela, do país dela, sem papéis, sem nada, que se viu em palpos de aranha com uma coisa mal feita. À época, e em desespero de causa, olhou para mim e achou-me com cara de Assistente Social. Já não sou e nem era, mas tenho cá os meus contactos. Os médicos são pessoas como nós.
Nestes anos todos que foram poucos, ela fez por mim aquilo que é natural os médicos fazerem: receitou-me um medicamento milagroso que custa 3 euros na farmácia (sem receita médica), depois de anos sem fim a aturar um médico que me ignorou as maleitas e me receitava placebo.
Eu andava desde os 25 anos a triptanos, e antes disso chegava a comer 17 comprimidos para manter a minha cabeça fora da lista de mártires. Se não explodiu até agora, a ela lho devo.
Andei um ror de estações de metro para chegar ao Centro de Saúde. Já não estou habituada. Dezembro já vai longe. Mas a minha médica, que é fantástica, deu-me um ótimo conselho:
- Onde vais fazer estes exames?
- Não sei, talvez em Lisboa. Mudei-me para lá.
- Mudaste??!! Ahh vai lá, vai lá. E mudas também de médico, ficas mais perto.
- Mas se já nos conhecemos...
- Não! Muda, muda, que eu já tenho 2 000 utentes.
Vou ter saudades disto.
5 de abril de 2016
Vocês também pagam IMI?
Fotografia roubada descaradamente à rodapés.
Se quiserem saber a fonte, ela tem lá tudo.
É muito organizada.
:P
Vou contar-vos tudo
A Uva anda com uma depressão sazonal, muito arreigada. É sabido que a falta de sol provoca coisas estranhas no corpo, que o cabelo perde o brilho, que a pele se eriça e fica seca, no meu caso nos tornozelos, credo, uma tal desgraça que peço a Deus nunca ter de baixar o cano da meia escondido dentro do cano da bota.
Foi da mudança.
Ah que quando muda Deus ajuda. Pois sim, e estou grata por ter corrido tudo bem, consegui pregar os quadros todos nas paredes, não apareceram por enquanto as humidades, a roupa seca bem, a gata adaptada.
Só que agora ando doente.
Parece que sou uma oliveira alentejana transplantada para uma rotunda do Rossio.
Foi da mudança.
Ah que quando muda Deus ajuda. Pois sim, e estou grata por ter corrido tudo bem, consegui pregar os quadros todos nas paredes, não apareceram por enquanto as humidades, a roupa seca bem, a gata adaptada.
Só que agora ando doente.
Parece que sou uma oliveira alentejana transplantada para uma rotunda do Rossio.
O mistério das tubagens de 'paper'
Eu sei que anda tudo muito 'interessado' nas contas que os ricos (e o Messi) têm nas offshore desta vida. É uma notícia interessante e vem mesmo a calhar, sobretudo porque vem sobrepor-se ao discurso do Passos, e já ninguém aguenta os discursos do Passos, muito menos se acompanhados pelas conclusões da espatafurdia Maga-Constantológica num telejornal perto de si.
Longe de mim querer banalizar essa coisa tão interessante que é os ricos terem contas nas offshore para fugir à austeridade dos líderes dos seus partidos, mas é que o tema suscita-me o mesmo interesse que o penalti caridoso que o árbitro ofereceu ao Braga, só para agradar o Presidente da República, um amigo tão querido da nação.
No entanto outros terramotos deram à costa, quer dizer, às costas, de uma certa empresa que faz autoestradas, e isso sim, parece-me assunto de valor, porque vendo bem as coisas foram ali muitos milhões enterrados, e agora, tal como o assunto das offshore, deu buraco.
Ele há engenheiros com muita lata, e esta frase da minha autoria ilustra bem a força do tema que aqui me traz hoje, e olhem que era preciso um tema destes para me tirar da cama, depois da tareia que levei ontem com aquele post sobre o Código Penal...
Bom.
Entrando agora mais a fundo no tema, deixem-me apresentar aqui um pequeno 'paper' sobre a minha opinião.
Que os engenheiros tenham construído uma autoestrada sobre uma ribeirinha que entretanto passava dentro de uns tubinhos um bocadinho mais fortes do que aqueles que o Maradona costumava usar para dar umas snifadelas, não é coisa que me choque, apesar de tudo aquilo ser provisório e não estar previsto passar lá mais nada do que meros aviões, ou alguma cabra perdida, o que realmente me faz espécie é ver, depois daquela porcaria ter desabado toda em cima das tubagens escoadeiras, e estar ali um perigo do caraças para as viaturas e para as pessoas, foi ver um bombeiro com a sua viatura de serviço, andar para cá e para lá, a passar exatamente onde a estrada não cedeu (por sorte), como forma de bravura autónoma, passando 'papers' de estupidez os engenheiros, e bem passados, e às autoridades que ali estavam muito circunspectas a falar do assunto das 5 batatas - quer dizer, dos campos agrícolas onde foi construída a autoestrada -, e dizendo [o bombeiro] com esta passeata, que pôs (a meu ver, e eu vejo mal) em causa a sua segurança e a segurança da viatura, quiçá de toda a sua família dependente, que aquilo cedeu, cortaram a estrada por perigo eminente, ninguém passava, nem a cabra, mas que a ele, ao bombeiro herói, nunca a derrocada haveria de o atingir, porque ele é bombeiro, um homem sem medos, e que essa coisa de a estrada ceder de repente no exato momento em que ele se passeava por cima da zona mais perigosa, não haveria de acontecer a ele, porque esses azares só acontecem aos outros.
Os outros são, claro, os ricos que brincam aos engenheiros e enfiam o dinheiro dentro de palhinhas tão seguras como autoestradas.
Longe de mim querer banalizar essa coisa tão interessante que é os ricos terem contas nas offshore para fugir à austeridade dos líderes dos seus partidos, mas é que o tema suscita-me o mesmo interesse que o penalti caridoso que o árbitro ofereceu ao Braga, só para agradar o Presidente da República, um amigo tão querido da nação.
No entanto outros terramotos deram à costa, quer dizer, às costas, de uma certa empresa que faz autoestradas, e isso sim, parece-me assunto de valor, porque vendo bem as coisas foram ali muitos milhões enterrados, e agora, tal como o assunto das offshore, deu buraco.
Ele há engenheiros com muita lata, e esta frase da minha autoria ilustra bem a força do tema que aqui me traz hoje, e olhem que era preciso um tema destes para me tirar da cama, depois da tareia que levei ontem com aquele post sobre o Código Penal...
Bom.
Entrando agora mais a fundo no tema, deixem-me apresentar aqui um pequeno 'paper' sobre a minha opinião.
Que os engenheiros tenham construído uma autoestrada sobre uma ribeirinha que entretanto passava dentro de uns tubinhos um bocadinho mais fortes do que aqueles que o Maradona costumava usar para dar umas snifadelas, não é coisa que me choque, apesar de tudo aquilo ser provisório e não estar previsto passar lá mais nada do que meros aviões, ou alguma cabra perdida, o que realmente me faz espécie é ver, depois daquela porcaria ter desabado toda em cima das tubagens escoadeiras, e estar ali um perigo do caraças para as viaturas e para as pessoas, foi ver um bombeiro com a sua viatura de serviço, andar para cá e para lá, a passar exatamente onde a estrada não cedeu (por sorte), como forma de bravura autónoma, passando 'papers' de estupidez os engenheiros, e bem passados, e às autoridades que ali estavam muito circunspectas a falar do assunto das 5 batatas - quer dizer, dos campos agrícolas onde foi construída a autoestrada -, e dizendo [o bombeiro] com esta passeata, que pôs (a meu ver, e eu vejo mal) em causa a sua segurança e a segurança da viatura, quiçá de toda a sua família dependente, que aquilo cedeu, cortaram a estrada por perigo eminente, ninguém passava, nem a cabra, mas que a ele, ao bombeiro herói, nunca a derrocada haveria de o atingir, porque ele é bombeiro, um homem sem medos, e que essa coisa de a estrada ceder de repente no exato momento em que ele se passeava por cima da zona mais perigosa, não haveria de acontecer a ele, porque esses azares só acontecem aos outros.
Os outros são, claro, os ricos que brincam aos engenheiros e enfiam o dinheiro dentro de palhinhas tão seguras como autoestradas.
3 de abril de 2016
Da fina ironia do Código Penal português
A alínea 1 do artigo n.º 299 do Código Penal, diz que " quem promover ou fundar grupo, organização ou associação cuja finalidade ou actividade seja dirigida à prática de um ou mais crimes, é punido com pena de prisão de um a cinco anos'.
O que quer isto dizer?
Quer dizer que não é preciso que se tenha praticado crime nenhum, não é preciso que tenha acontecido alguma coisa, basta que eventualmente, um grupo de pessoas se tenha reunido, tendo como finalidade praticar alguma atividade que esse mesmo grupo nem sequer entenda como crime, mas que a lei pune dessa forma.
É interessantíssimo perceber, e para isso bastará comprar um livrinho que ocupa muito pouco espaço na estante, mas que é enorme [Constituição Portuguesa], que aí, nesse mesmo livrinho, existem normas claríssimas de liberdade de expressão, de liberdade de pensamento, liberdade de opinião, que depois na lei ordinária, e mormente no Código Penal, são completamente ignoradas.
Nas ofensas corporais, por exemplo, passa-se exatamente a mesma coisa.
Se alguém der um estalo numa pessoa, por qualquer motivo que não vem agora ao caso, e eu, publicamente, escrever ou opinar publicamente a minha concordância com esse estalo, sou criminosa, e posso ser perseguida criminalmente por isso, porque de acordo com o artigo 298º do Código Penal, tal ato é punido com uma pena de prisão até 6 meses.
São, como diz a Amnistia Internacional, crimes de consciência. Eu verbalizo no meu blog aquilo que na minha consciência é produzido sobre o crime, e se houver concordância, o código penal chega, lê os direitos à minha consciência, algema-a e prende-a. E eu, claro, lá vou com ela, com as mãos atrás das costas.
A partir daqui é fácil extrapolar isto para um livro. Se o livro incita ao um qualquer crime, que pode até ser o crime de 'democracia' (se estivermos a falar de países ditadores), quem o estiver a ler, em grupo, numa reunião privada, pública, na sua casa, ou no jardim, estará ou poderá estar (se assim o entender o juiz) automaticamente a concordar com ele, e posto desta forma, sendo tão criminoso quanto o seu autor, porque promotor das ideias do livro, se as discutir em grupo e com elas concordar, por exemplo numa sala de aula.
Se concordarmos todos com o assassínio de Sadam, e publicamente afirmarmos que foi o melhor que nos aconteceu, matarem-no, somos criminosos e podemos ir lá parar com os costados.
Isto existe no nosso Código Penal e o mais extraordinário disto tudo, desta grande palhaçada que é o Código Penal (e o Código do Processo Penal) em Portugal, é as autoridades portuguesas criticarem a justiça angolana que pune um Luaty Beirão por ler um livro, quando cá, no nosso sistema penal, as coisas são exatamente iguais.
O que quer isto dizer?
Quer dizer que não é preciso que se tenha praticado crime nenhum, não é preciso que tenha acontecido alguma coisa, basta que eventualmente, um grupo de pessoas se tenha reunido, tendo como finalidade praticar alguma atividade que esse mesmo grupo nem sequer entenda como crime, mas que a lei pune dessa forma.
É interessantíssimo perceber, e para isso bastará comprar um livrinho que ocupa muito pouco espaço na estante, mas que é enorme [Constituição Portuguesa], que aí, nesse mesmo livrinho, existem normas claríssimas de liberdade de expressão, de liberdade de pensamento, liberdade de opinião, que depois na lei ordinária, e mormente no Código Penal, são completamente ignoradas.
Nas ofensas corporais, por exemplo, passa-se exatamente a mesma coisa.
Se alguém der um estalo numa pessoa, por qualquer motivo que não vem agora ao caso, e eu, publicamente, escrever ou opinar publicamente a minha concordância com esse estalo, sou criminosa, e posso ser perseguida criminalmente por isso, porque de acordo com o artigo 298º do Código Penal, tal ato é punido com uma pena de prisão até 6 meses.
São, como diz a Amnistia Internacional, crimes de consciência. Eu verbalizo no meu blog aquilo que na minha consciência é produzido sobre o crime, e se houver concordância, o código penal chega, lê os direitos à minha consciência, algema-a e prende-a. E eu, claro, lá vou com ela, com as mãos atrás das costas.
A partir daqui é fácil extrapolar isto para um livro. Se o livro incita ao um qualquer crime, que pode até ser o crime de 'democracia' (se estivermos a falar de países ditadores), quem o estiver a ler, em grupo, numa reunião privada, pública, na sua casa, ou no jardim, estará ou poderá estar (se assim o entender o juiz) automaticamente a concordar com ele, e posto desta forma, sendo tão criminoso quanto o seu autor, porque promotor das ideias do livro, se as discutir em grupo e com elas concordar, por exemplo numa sala de aula.
Se concordarmos todos com o assassínio de Sadam, e publicamente afirmarmos que foi o melhor que nos aconteceu, matarem-no, somos criminosos e podemos ir lá parar com os costados.
Isto existe no nosso Código Penal e o mais extraordinário disto tudo, desta grande palhaçada que é o Código Penal (e o Código do Processo Penal) em Portugal, é as autoridades portuguesas criticarem a justiça angolana que pune um Luaty Beirão por ler um livro, quando cá, no nosso sistema penal, as coisas são exatamente iguais.
2 de abril de 2016
Todos os dias são azuis
Hoje é um dia muito especial.
É o dia em que presto uma humilde homenagem à Be e ao seu macaquito, um dia em que presto uma homenagem a todas as Be e a todos os macaquitos por esse mundo fora, azuis, mas de muitas cores.
Sinto-me muito pequenina no meio destas mães gigantes, de corações enormes, mães fortes e resistentes, resilientes, e estóicas, mães que o são de algo maior que elas, um espectro, um mistério ainda por descobrir, mas que não as impede nunca de ser felizes nas suas frondosas árvores, olhando com curiosidade e muito amor, os seus macaquitos azuis, as suas crianças mistério, os seus amores maiores.
Não sou capaz de pintar um quadro, de fazer uma escultura, de transformar um simples objecto numa obra prima, mas sei que há meninos azuis que o fazem e sei que há meninos azuis que fazem coisas maravilhosas, que nos mostram coisas maravilhosas, e que por isso são tão especiais.
Hoje o meu dia é azul.
Para ti, minha querida Be, todos os dias são azuis.
Um abraço da Uva Macaca, azul, que passa.
No Dia Mundial da Consciencialização do Autismo apresento-vos uma menina de 5 anos, a Iris Grace, uma pequena artista que vive no Reino Unido com seus pais e seu gato Thula, e que cria obras que têm sido comparadas a pinturas impressionista de Monet, por colecionadores de todo o mundo.
É o dia em que presto uma humilde homenagem à Be e ao seu macaquito, um dia em que presto uma homenagem a todas as Be e a todos os macaquitos por esse mundo fora, azuis, mas de muitas cores.
Sinto-me muito pequenina no meio destas mães gigantes, de corações enormes, mães fortes e resistentes, resilientes, e estóicas, mães que o são de algo maior que elas, um espectro, um mistério ainda por descobrir, mas que não as impede nunca de ser felizes nas suas frondosas árvores, olhando com curiosidade e muito amor, os seus macaquitos azuis, as suas crianças mistério, os seus amores maiores.
Não sou capaz de pintar um quadro, de fazer uma escultura, de transformar um simples objecto numa obra prima, mas sei que há meninos azuis que o fazem e sei que há meninos azuis que fazem coisas maravilhosas, que nos mostram coisas maravilhosas, e que por isso são tão especiais.
Hoje o meu dia é azul.
Para ti, minha querida Be, todos os dias são azuis.
Um abraço da Uva Macaca, azul, que passa.
No Dia Mundial da Consciencialização do Autismo apresento-vos uma menina de 5 anos, a Iris Grace, uma pequena artista que vive no Reino Unido com seus pais e seu gato Thula, e que cria obras que têm sido comparadas a pinturas impressionista de Monet, por colecionadores de todo o mundo.
Menina artista, Iris Grace (http://irisgracepainting.com/)
1 de abril de 2016
(Editado) Português de Lisboa: ao que isto chegou…
Este post foi editado por motivo de denuncia de plágio à fonte anteriormente citada (NCultura) que supostamente plagiou o texto do Vitor Santos Lindegaard.
Peço desculpa ao visado, mas foi no NCultura que encontrei o texto, julgando estar a citá-los a eles e não a outros.
*****
Está tudo aqui no blog do Vítor Santos Lindegaard mas eu não resisti e copiei tudo.
E está mesmo fixe porque achava que como lisboeta que sou, não tinha sotaque, e vai-se a ver uso praticamente e da mesma forma todas as palavras que aqui ilustram o texto.
Achei super.
Ora vejam.
Muitas pessoas de Lisboa pensam que não têm sotaque. Toda a gente do Porto sabe que fala à Porto, mas muitas pessoas de Lisboa pensam que não têm um sotaque específico, que falam “um português neutro”… Ora o sotaque de Lisboa é um sotaque como outro qualquer. Como o de Beja ou de Portimão ou da Malveira da Serra. Sotaques neutros, só se forem as maneiras de falar artificiais, criadas precisamente para não serem de sítio nenhum nem de nenhuma classe, como a received pronunciation dos locutores da BBC; ou então o sotaque dos filhos de emigrantes, que não têm sotaque estrangeiro mas também não têm sotaque de nenhuma região. Tirando isso, o mais próximo de neutro é muito misturado. Mas o dialectologista perfeito, a existir, deveria ainda assim ser capaz de fazer avarias como as do Henry Higgins de Bernard Shaw, mal ouvisse alguém enunciar uma frase simples: “Ah, ah, já estou a ver, meu amigo: você nasceu na Moita, de uma mãe alentejana e pai estremenho, mudou-se no fim da infância para Pero Pinheiro, mas fez os estudos em Sintra, e, quando acabou o liceu, foi morar para Vila Real de Santo António*…”
Há muitas pessoas (sobretudo de fora de Lisboa, naturalmente) que pensam que, sobretudo com a força uniformizadora da televisão, o português de Lisboa está a ser imposto ao resto do país e a dar cabo dos falares regionais. É verdade até certo ponto. É verdade que a variante do português que se está a espalhar é o falar das classes “cultas” da capital e não há nisso nada de extraordinário: normalmente o falar “culto” da cidade ou da zona mais importante é o que se impõe. É assim a vida…
Lisboa era uma ilha linguística, no meio dos falares meridionais, que, curiosamente, começam não a sul do Tejo, como seria talvez de prever, mas um bocadinho a norte, não sei porquê (ou começavam, seja, isto agora está tudo muito esbatido…). A única característica do sotaque lisboeta que tenho a certeza que se está a propagar bem é o chamado r gutural. Mas é de notar que não é um fenómeno oriundo só de Lisboa, mas também do Porto e das ilhas. Não sei até que ponto é que outra característica do sotaque lisboeta que é pronunciarem-se da mesma maneira os sons correspondentes às grafias -ãe e -em estará também a espalhar-se. E também não posso dizer se o pronunciar-se -io como -iu (rio como riu, por exemplo), que era o traço mais caricato do falar da capital para ouvidos não lisboetas (o que eu fui gozado por causa disso!...) também não se estará a difundir… De resto, as demais características daquilo a que eu chamo, sem grande rigor técnico, mas com o coração inflado de bairrismo (ai, credo, ‘tadinho…) “o verdadeiro sotaque da Lísbia” não têm tido, de certeza, a mesma fortuna. E estão, acho eu, tão ameaçadas como as dos outros falares regionais...
Uma característica daquilo a que eu chamo o “verdadeiro sotaque da Lísbia” é a abertura de certos oo: não se diz tourada, mas sim tòrada; nem se diz ourives, mas sim òrives; não se diz chouriço, mas sim chòriço; não se diz ouvir, mas sim òvir; etc. E não são só os -ou- que se pronunciam ó – também au- e até al-, às vezes: “Vais ó Ògueirão? Òguenta aí, qu’eu vou contigo!”
Há também muitos ii que não se pronunciam. Se alguém me disser que é “de Lisboa”, eu acho esquisito, porque em Lisboa diz-se L’sboa, não se diz Lisboa… E nem é esquisito que eu acho, é ‘squ’sito.
Aliás, às vezes nem é ‘squ’sito que se diz, é chq’sito, depende. Ora aí têm mais uma característica do sotaque de Lisboa: pronunciar os ss em fim de sílaba como ss explosivos de início de sílaba. Por outras palavras, pronunciar da mesma maneira chefia e esfia.
Outra coisa típica é o desaparecimento de muitos rr. Por exemplo, os que vêm em final de palavra costumam desaparecer: “Tavas a falá’ c’a Dona Luísa?” “Não, ‘tava a falá’ c’uma mulhé’ que tu não conheces…” Mas não só, também noutros contextos: “Não comp’s isso aqui! Quat’centos paus? Atão s’eu ‘inda ontem vi isso mais barato nout’ lado. Os gajos aqui são semp’ careiros, pá!”
Mas, por outro lado, também pode, às vezes, ouvir-se o r seguido de uma vogal que não aparece na escrita e que pode variar um bocado: “Estás a perceber?” pode ser “‘Tás a ‘cê’ere?” ou, mais rufia ainda, “‘Tàs a cê’erim?”. Neste aspecto, o sotaque de Lisboa é mesmo um sotaque do Sul, não haja dúvida.
Como nos outros sotaques do Sul, também se transforma, em Lisboa, o ditongo -ei- numa vogal só. Só que, em vez de se o reduzir a ê, como nos sotaques saloio, alentejano ou algarvio, transforma-se-o antes em â: peixe diz-se pâxe, madeira diz madâra e assim sucessivamente…
Há também palavras isoladas que têm uma pronúncia especial. Não existe o advérbio muito mas só uma variação bizarra desse advérbio, muita (muitas vezes pronunciado m’ta): muita grande, muita pequeno, muita giro, etc. E o mesmo se passa com o quantificador de nome: muita peso, muita dinheiro, sempre muita... Também não existe também, mas sempre e só tamém (quase como em asturiano, não é?). E não se diz mesmo, mas antes memo. O adjectivo grande, quando vem anteposto a um nome, pronuncia-se sempre ganda: ganda pinta, ganda problema, etc.
Bom, e deve haver muitas mais que agora não me vêm à cabeça. Mas ‘tá-s’a perdê’ ist’tudo… ‘Gora, a malta fala como escreve, é uma tr’steza. Quat’centchinquenta agora pronuncia-se quatrocentos e cinquenta, vâjam lá vocês ó qu’ist’chegou… E depois, as palavras q’agora s’usam, um gaj’inté fica azul… Uma drofa agora chama-se porta e umas galdinas agora são calças… Até já há quem chame esófago ao canal da sopa…
Peço desculpa ao visado, mas foi no NCultura que encontrei o texto, julgando estar a citá-los a eles e não a outros.
*****
Está tudo aqui no blog do Vítor Santos Lindegaard mas eu não resisti e copiei tudo.
E está mesmo fixe porque achava que como lisboeta que sou, não tinha sotaque, e vai-se a ver uso praticamente e da mesma forma todas as palavras que aqui ilustram o texto.
Achei super.
Ora vejam.
Muitas pessoas de Lisboa pensam que não têm sotaque. Toda a gente do Porto sabe que fala à Porto, mas muitas pessoas de Lisboa pensam que não têm um sotaque específico, que falam “um português neutro”… Ora o sotaque de Lisboa é um sotaque como outro qualquer. Como o de Beja ou de Portimão ou da Malveira da Serra. Sotaques neutros, só se forem as maneiras de falar artificiais, criadas precisamente para não serem de sítio nenhum nem de nenhuma classe, como a received pronunciation dos locutores da BBC; ou então o sotaque dos filhos de emigrantes, que não têm sotaque estrangeiro mas também não têm sotaque de nenhuma região. Tirando isso, o mais próximo de neutro é muito misturado. Mas o dialectologista perfeito, a existir, deveria ainda assim ser capaz de fazer avarias como as do Henry Higgins de Bernard Shaw, mal ouvisse alguém enunciar uma frase simples: “Ah, ah, já estou a ver, meu amigo: você nasceu na Moita, de uma mãe alentejana e pai estremenho, mudou-se no fim da infância para Pero Pinheiro, mas fez os estudos em Sintra, e, quando acabou o liceu, foi morar para Vila Real de Santo António*…”
Há muitas pessoas (sobretudo de fora de Lisboa, naturalmente) que pensam que, sobretudo com a força uniformizadora da televisão, o português de Lisboa está a ser imposto ao resto do país e a dar cabo dos falares regionais. É verdade até certo ponto. É verdade que a variante do português que se está a espalhar é o falar das classes “cultas” da capital e não há nisso nada de extraordinário: normalmente o falar “culto” da cidade ou da zona mais importante é o que se impõe. É assim a vida…
Lisboa era uma ilha linguística, no meio dos falares meridionais, que, curiosamente, começam não a sul do Tejo, como seria talvez de prever, mas um bocadinho a norte, não sei porquê (ou começavam, seja, isto agora está tudo muito esbatido…). A única característica do sotaque lisboeta que tenho a certeza que se está a propagar bem é o chamado r gutural. Mas é de notar que não é um fenómeno oriundo só de Lisboa, mas também do Porto e das ilhas. Não sei até que ponto é que outra característica do sotaque lisboeta que é pronunciarem-se da mesma maneira os sons correspondentes às grafias -ãe e -em estará também a espalhar-se. E também não posso dizer se o pronunciar-se -io como -iu (rio como riu, por exemplo), que era o traço mais caricato do falar da capital para ouvidos não lisboetas (o que eu fui gozado por causa disso!...) também não se estará a difundir… De resto, as demais características daquilo a que eu chamo, sem grande rigor técnico, mas com o coração inflado de bairrismo (ai, credo, ‘tadinho…) “o verdadeiro sotaque da Lísbia” não têm tido, de certeza, a mesma fortuna. E estão, acho eu, tão ameaçadas como as dos outros falares regionais...
Uma característica daquilo a que eu chamo o “verdadeiro sotaque da Lísbia” é a abertura de certos oo: não se diz tourada, mas sim tòrada; nem se diz ourives, mas sim òrives; não se diz chouriço, mas sim chòriço; não se diz ouvir, mas sim òvir; etc. E não são só os -ou- que se pronunciam ó – também au- e até al-, às vezes: “Vais ó Ògueirão? Òguenta aí, qu’eu vou contigo!”
Há também muitos ii que não se pronunciam. Se alguém me disser que é “de Lisboa”, eu acho esquisito, porque em Lisboa diz-se L’sboa, não se diz Lisboa… E nem é esquisito que eu acho, é ‘squ’sito.
Aliás, às vezes nem é ‘squ’sito que se diz, é chq’sito, depende. Ora aí têm mais uma característica do sotaque de Lisboa: pronunciar os ss em fim de sílaba como ss explosivos de início de sílaba. Por outras palavras, pronunciar da mesma maneira chefia e esfia.
Outra coisa típica é o desaparecimento de muitos rr. Por exemplo, os que vêm em final de palavra costumam desaparecer: “Tavas a falá’ c’a Dona Luísa?” “Não, ‘tava a falá’ c’uma mulhé’ que tu não conheces…” Mas não só, também noutros contextos: “Não comp’s isso aqui! Quat’centos paus? Atão s’eu ‘inda ontem vi isso mais barato nout’ lado. Os gajos aqui são semp’ careiros, pá!”
Mas, por outro lado, também pode, às vezes, ouvir-se o r seguido de uma vogal que não aparece na escrita e que pode variar um bocado: “Estás a perceber?” pode ser “‘Tás a ‘cê’ere?” ou, mais rufia ainda, “‘Tàs a cê’erim?”. Neste aspecto, o sotaque de Lisboa é mesmo um sotaque do Sul, não haja dúvida.
Como nos outros sotaques do Sul, também se transforma, em Lisboa, o ditongo -ei- numa vogal só. Só que, em vez de se o reduzir a ê, como nos sotaques saloio, alentejano ou algarvio, transforma-se-o antes em â: peixe diz-se pâxe, madeira diz madâra e assim sucessivamente…
Há também palavras isoladas que têm uma pronúncia especial. Não existe o advérbio muito mas só uma variação bizarra desse advérbio, muita (muitas vezes pronunciado m’ta): muita grande, muita pequeno, muita giro, etc. E o mesmo se passa com o quantificador de nome: muita peso, muita dinheiro, sempre muita... Também não existe também, mas sempre e só tamém (quase como em asturiano, não é?). E não se diz mesmo, mas antes memo. O adjectivo grande, quando vem anteposto a um nome, pronuncia-se sempre ganda: ganda pinta, ganda problema, etc.
Bom, e deve haver muitas mais que agora não me vêm à cabeça. Mas ‘tá-s’a perdê’ ist’tudo… ‘Gora, a malta fala como escreve, é uma tr’steza. Quat’centchinquenta agora pronuncia-se quatrocentos e cinquenta, vâjam lá vocês ó qu’ist’chegou… E depois, as palavras q’agora s’usam, um gaj’inté fica azul… Uma drofa agora chama-se porta e umas galdinas agora são calças… Até já há quem chame esófago ao canal da sopa…
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