Não as soltei da gaveta e nem de cadernos escondidos. Soltei-as porque foram as letras, as palavras e os livros, que me fizeram, e que me transformaram na pessoa que hoje sou.
Isto é estúpido.
Fazer um tributo às letras e aos livros, quando no fundo deveria agradecer às pessoas que me inspiraram e que me inspiram a escrever.
É certo. Mas fizeram mais por mim certos livros do que certas pessoas.
E gosto das letras acima de muitas coisas, porque quase tudo o que conquistei, até alguns afetos, foi pelas letras.
Nunca me tinha apercebido disso até ao dia em que por mero acaso me cruzei com uma lembrança antiga: um certo quinze a matemática. O estranho episódio, passado no princípio do fim da minha aventura pelas ciências, foi bastante contestado. Na verdade, não fiz um único exercício. Não somei nem dividi, não cheguei a nenhum resultado numérico, e matematicamente falando, o meu teste, acaso fosse corrigido através do protocolo rígido e estático dos números, havia de levar um valente traço vermelho a todo o cumprimento da folha, atestando uma vez mais a minha inépcia para a disciplina.
Mas um náufrago agarra-se nem que seja a um palito.
Um grande amigo meu, que já não vejo há muitos anos, explicou-me, sem recorrer aos números, que eu não entendia, a teoria por detrás dos exercícios que iriam compor o teste, e foi através da minha explicação teórica dos exercícios, uma abordagem totalmente diferente de resolver o irresolúvel, que coloquei no lugar de números, palavras. E safei-me.
O Universo não falha.
Também não falhou quando vi a minha tese final de curso, que talvez
ninguém procure, enterrar-se numa prateleira da Biblioteca Nacional.
Também não falhou quando apresentei a memória descritiva que havia de me trazer o investimento monetário suficiente para criar, além do meu, mais quatro postos de trabalho, com um projeto pioneiro, retirado todo ele da minha imaginação. Como se fosse um livro, desenhei uma empresa onde nenhuma engrenagem tinha espaço para falhar, onde nada poderia dar errado. Onde o sucesso apenas se fazia de letras, e frases. E ganhei.
Um ano depois de ter começado o blog, um novo projeto apareceu, do nada, e trouxe-me à memória as pessoas que acreditaram e acreditam em mim, e no que escrevo.
Isto não são só blogs.
Percebo agora que cada vez mais pessoas seguem este caminho. Com letras conquistam sonhos, com letras desabafam tristezas, com letras conhecem pessoas que talvez lhes digam mais virtualmente escondidas, do que pessoas conhecidas lhes dizem escancaradas.
Percebo agora que cada vez mais pessoas seguem este caminho. Com letras conquistam sonhos, com letras desabafam tristezas, com letras conhecem pessoas que talvez lhes digam mais virtualmente escondidas, do que pessoas conhecidas lhes dizem escancaradas.
A Uva Passa não é só um blog.
A Uva Passa serviu para perceber que talvez eu tenha aqui um instrumento que mais alto me levanta.
Porque há um ano atrás eu estava de rastos.
Porque há um ano atrás as minhas conquistas, afuniladas numa vida tarefeira e menor, labutando em afazeres que se me sobrepunham, teimavam em mirra-me a vida.
Esta vida sem palavras e sem graça, levou-me a um sítio escravo. E passamos a ser escravos no exato momento em que deixamos de ser criativos.
A Uva Passa teve este efeito maravilhoso em mim e que todos procuramos ardentemente e infinitamente.
O poeta disse-o: libertarmo-nos da lei da morte.
E porque morremos todos os dias mais um dia, precisamos de encontrar no caminho alguma coisa que nos mantenha vivo o amanhã. Nem que seja um post.
Isto é para mim a Uva Passa.
O Universo não me falha.
Continuarei a escrever enquanto mais alto se levantar o espírito que aqui me traz.
O espírito da partilha.
Parabéns Uva Passa.
Contes muitos, e que contes muitas. Alguém algures estará a ler-te.
E isto não acaba aqui.
Porque as (minhas) letras perduram para sempre.