3 de fevereiro de 2015

Ainda dizem vocês que a vida está difícil...


 Cozinha do Palácio de Versaille na Idade Média

Pois hoje, meus amigos - que a Uva anda imparável e só quer é escrever e escrever - decidi deixar-vos algumas curiosidades dos idos de 1600 a 1700 que são de bradar aos céus, ou à 'nuvem', se quisermos ser mais actuais.
Sempre fui apaixonada por história, sou louca por pessoas e hábitos, e desde que li 'A Taberna' e depois 'Germinal' de Émile Zola, fiquei presa às condições de vida das pessoas ali descritas, e foi de todos, o principal motivo para a escolha daquilo que viria a ser a minha profissão.

Ora vejam se não é de ânimo leve que dizemos que a vida está difícil:

1 - Quando se visita o Palácio de Versailles, em Paris, observa-se que o sumptuoso edifício não tem casas de banho. Que grande nojeira. Contava-me um ilustre professor de história que era normal
as excrescências humanas serem despejadas pelas janelas do palácio. 'Água vai!' era a expressão mais utilizada para tal costume, sendo que as ruas, enfim... já imaginaram? mais cagalhotos do que no passeio da canzoada... e maiores... uma visão (e cheiro) do inferno, portanto. 

2 - Na Idade Média, não existiam dentífricos, escovas de dentes, perfumes, desodorizantes, e muito menos papel higiénico. Em dia de festa, a cozinha do palácio que preparava banquete para 1.500 pessoas, sem a mínima higiene, servia igualmente as iguarias a 1.500 que não lavavam dentes, não usavam desodorizante e o resto lá nas 'partes', pois já se sabe.
Vemos, nos filmes de hoje, as pessoas sendo abanadas. A explicação não está no calor, mas no mau cheiro que exalavam por debaixo das saias (que propositadamente eram feitas para conter o odor das partes íntimas - vou desmaiar). O mau cheiro era dissipado pelo abanador e só os nobres tinham empregados para os abanar, para dissipar o mau cheiro que o corpo e boca exalavam, além de, também, espantar os insetos.... ahhhhhhhhhhhhhhh insetos.... credo!

3 - Na Idade Média, a maioria dos casamentos ocorria no mês de Junho (para eles, o início do verão). A razão é simples: o primeiro banho do ano era tomado em Maio; assim, em Junho, o cheiro das pessoas ainda era tolerável. Entretanto, como alguns odores já começavam a incomodar, as noivas carregavam ramos de flores, junto ao corpo, para disfarçar o mau cheiro. Daí termos Maio como o "mês das noivas" e a origem do "ramo de noiva" explicada.

4 - Os banhos eram tomados numa única banheira enorme, cheia de água quente. O chefe da família tinha o privilégio do primeiro banho na água limpa. Depois, sem trocar a água, vinham os outros homens da casa, por ordem de idade, as mulheres, também por idade e, por fim, as crianças. 
Os bebés eram os últimos a tomar banho. Quando chegava a vez deles, a água da banheira já estava tão suja que era possível "perder" um bebé lá dentro. É por isso que existe a expressão em inglês "don't throw the baby out with the bath water", ou seja, literalmente, "não despeje o bebé juntamente com a água do banho", que hoje usamos para os mais apressadinhos.

5 - Os telhados das casas não tinha forro e as vigas de madeira que os sustentavam era o melhor lugar para os animais - cães, gatos, ratos e besouros se aquecerem. Quando chovia, as goteiras forçavam os animais a saltarem para o chão. Assim, a expressão "está a chover a potes" tem seu equivalente em inglês em "it's raining cats and dogs" (chovem gatos e cães).

6 - Aqueles que tinham dinheiro possuíam pratos de estanho. Certos tipos de alimento oxidavam o material, fazendo com que muita gente morresse envenenada (lembremo-nos de que os hábitos higiénicos da época eram péssimos). Os tomates, sendo ácidos, foram considerados, durante muito tempo, venenosos. Os copos de estanho eram usados para beber cerveja ou whisky. Essa combinação, às vezes, deixava o indivíduo "no chão" (numa espécie de narcolepsia, induzida pela mistura da bebida alcoólica com óxido de estanho). Grandes mocas pah! A ver se experimento isto com os pratos de estanho da minha sogra...

7 - Estes estados de envenenamento eram muito comuns. Alguém que passasse na rua e visse um homem narcolepsico poderia pensar que ele estivesse morto, e assim, recolhia o corpo e preparava o enterro.
O corpo era, então, colocado sobre a mesa da cozinha por alguns dias e a família ficava em volta, em vigília, comendo, bebendo e esperando para ver se o morto acordava ou não. Daí surgiu o velório, que é a vigília junto ao caixão.
 
8 - Em Inglaterra, alguns anos após um cadáver ser enterrado, os caixões eram abertos, os ossos retirados e postos em ossários. O túmulo era utilizado para outro cadáver. Às vezes, ao abrirem os caixões, apercebiam-se que havia arranhões nas tampas, do lado de dentro, o que indicava que aquele morto, na verdade, tinha sido enterrado vivo. Surgiu, assim, a ideia de, ao se fechar o caixão, amarrar uma tira no pulso do falecido, passá-la por um buraco feito no caixão e amarrá-la a um sino. Após o enterro, alguém ficava de guarda ao lado da campa, durante uns dias. Se o indivíduo acordasse, o movimento de seu braço faria o sino tocar. E ele seria "saved by the bell", ou "salvo pelo sino", expressão usada por nós até os dias de hoje.

E por hoje é tudo, meus amigos, amanhã voltaremos à nossa programação habitual.
Obrigada pela vossa companhia!

18 comentários:

  1. Maravilhoso! Adoro saber estas coisas e os livros foram directamente para a "Wish list". Algumas das curiosidades já conhecia, as outras foi agradável (?) conhecer. Obrigada!

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    1. De nada Teresa!
      Os livros valem muito a pena.
      Li há muitos anos atrás, e a Taberna, lá está, li duas vezes e das duas a impressão foi sempre a mesma. Imagens que não saem da cabeça.

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  2. O_o
    Viva a evolução, Viva as SANITAS!!!!
    Obrigado pela invenção da higiene pessoal e tudo o que daí advém!!!!
    (o teu texto é tão "palpável" que estou enjoada!!)

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    1. Aquela cena das noivas em maio... é que eu casei em maio e sou muito asseadinha... e não fazia ideia do porquê do maio ser o mês das noivas...

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  3. Adoro. Fico à espera de mais. :)

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  4. Eu casei em Abril. Pela lógica dos anos passados seria certamente para me banhar com o excelso esposo na banheira. :)

    (E sim, eu sei que supostamente nessa altura eles nem se viam totalmente nus.)

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    1. Eles tomavam banho com as roupas interiores... qual nus qual carapuça pah!
      Banhinho com o esposo só em sonhos (muito eróticos).
      Hahahahah
      Banhinho não é?? Querias!

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    2. São estas "pequenas" coisas que me fazem adorar o facto de viver neste momento histórico.
      (O facto de termos medicação para não sofrermos horrores com dores de ouvidos, garganta, dentes e afins também contribui)

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  5. Que horror, eles cheiravam quase tão mal como eu, quando vou andar de bicicleta com 40º.

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    1. Hahahahahahahahahaha
      Não chegavam a esse ponto loira, não exageres!
      ;)

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  6. Eles achavam o cheiro afrodisíaco! ;)

    Beijocas, Uvinha! :)

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  7. Algumas das curiosidades já as conhecia.

    Além do estanho, outros metais pesados foram utilizados em civilizações antigas. Dois exemplos de metais pesados: mercúrio e chumbo que foram muito utilizados na Roma Antiga para a construção de aquedutos por serem baratos e fáceis de trabalhar. A utilização destes metais para passagem de água trouxe consequências nefastas, uma vez que causa doenças renais, anemias, bebés prematuros, doenças neurológicas/demência. Portanto, a provável loucura de alguns imperadores romanos muito provavelmente deve-se ao Chumbo e ao Mercúrio. ;)

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  8. Casei em Março, mesmo antes do banho portanto, mas juro que levava um vestido comprido e me abanei muito, quase não se notava o cheiro eheheheheh.
    Esses badamecos da Idade Média eram mesmo uns badalhocos! :D:D

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  9. Já aprendi umas coisas giras...Tomar banho era desperdiçar água.... só se tomava banho quando o rei fazia anos!

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