27 de junho de 2015

Da Loucura

Publicado originalmente no DESblogue d'Elite


Ao longo da minha vida fui muitas vezes louca, o que não quer dizer, faço notar, que o corpo me fosse indiferente. 
No limite encarava a minha loucura como um abandono corporal, uma certa elevação mental, embora a loucura me transportasse para um estado muito nítido de excitação física. 
A loucura artificial é uma espécie de ego experimental (Milan Kundera), uma experimentação de nós mesmos, baseada na liberdade de não sentir limites, nem mesmo os da pele. 
Para mim a loucura foi sempre um espaço artificial, uma tontura, uma interrogação. Não queria saber se depois daquilo tudo, das inúmeras consequências que o meu comportamento rebarbativo provocava nos outros, pressionados sobretudo por preconceitos ligados ao sério e ao formal, poderiam trazer-me quando acordasse daquele estado.
Ninguém entende nada disto da Loucura. Ninguém quer saber de ir jantar com um amigo e de repente esse amigo se transformar num personagem desconhecido. 
Muitas vezes decidi ficar louca. Não é uma decisão fácil, porque implica descer baixo de altas considerações, implica transformar a ideia que os outros têm de nós, implica saltar para cima da cama e desarranjar os lençóis, implica amarrotar a reputação.
Mas que quereis? Que aceite assim a imutabilidade da vida, que passe as minhas noites insone sem saber nada da loucura, sem saber como sou se estiver fora de mim?
E se um dia estiver mesmo fora de mim naturalmente? Não será isso uma verdadeira loucura? Não saber, ali, naquele estado, o que faço comigo?
Por tudo isto decidi decidir que sou um ser bígamo.  
Movo-me entre dois mundos totalmente diferentes. Um em que suporto a vida, duro, não me mexo para não desarrumar, para não suscitar questões, para não me confundirem, para me sentir integrada, pertencida, e outro, construído, totalmente ausente, totalmente teatral, quase inverosímil,  que me diverte, que me camufla. Sou louca, sou inglesa, sou rica, sou marinheira, médica, engenheira, estou perdida, fiquei esquecida.
O que se passou aqui? 
A loucura passou por mim?
Tanto faz.  
Fica apenas a evidência: o pior é a ressaca.







Jim Morrison@google

3 comentários:

  1. Pois, querida Uva, pelo que aqui conta, considero-a muito saudável. Muito mesmo. E estou a falar a sério.

    Um beijinho

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  2. Eu, Meu Contrário e Minha Alma vivem em constante ressaca
    Fazemos da loucura uma aventura.

    Diz-me a Minha Alma, citando o povo,
    que "de poeta e de louco todos temos um pouco"

    De louco muito, de poeta pouco, mas ninguém é perfeito...

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  3. É na loucura que somos mais felizes, que somos mais nós e mais verdadeiros. Quanto à ressaca... guronsan!

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