Apesar do crescente desprezo, raiva, engulhos, e sobretudo aquele quebranto estranho que nasce pela manhã e que nos mata a motivação para as tarefas no respetivo local de trabalho, a verdade é que se nos desligarmos totalmente daquilo que lá vamos fazer, da tarefa em si, do trabalhinho ordinário e sensaborão que conseguimos conquistar ao fim de tantos anos de sonhos elevadíssimos sobre onde deveríamos estar na pirâmide profissional (e onde quase nunca estamos), a verdade, dizia eu, é que se tivermos um bom ambiente de trabalho, se tivermos quem nos venha acompanhar no café da manhã, se tivermos alguém que passe no nosso gabinete (mesmo que não nos suporte o resto do dia) e nos diga um rasgado bom dia, um olá, um merda qualquer, nem que seja um cuspo na porta, é certo e sabido que a pessoa fica mais animada, enganada mas animada, e tudo se vai compondo nas restantes horas do dia.
Mas não.
Insistem nas portas fechadas, nas bocas fechadas, nos braços fechados.
E nós, cansados de dar tudo por tudo, mesmo quando não nos apetece nada de nada, acabamos por culpabilizar a nossa pouca vontade, que se calhar até é miúda para ficar ali plasmada na nossa cara matinal, de que os nossos colegas de trabalho são todos uma masmorrice do pior, uns malcriados de primeira apanha, e que azar, com tanta empresa para vir cair, havia logo de me espalhar ao comprido nesta.
Conto-vos aqui uma passagem desta minha interessante vida, e que por poucas palavras se consubstancia nisto: uma pessoa trabalha há vários anos numa empresa e tem há vários anos os mesmos colegas, com ligeiras alterações, poucas.
Uma pessoa compartilha, partilha, trilha, coisas e caminhos, opiniões e almoços, assuntos e problemas, vidas e razões, uns dias melhor, outros dias pior, mas sempre consciencializada de que alguma coisa ali se cria e nasce, mesmo torta, mesmo azeda, mas que é alguma coisa, e de um dia para outro vê-se confrontada com uma coisa deste género:
- Olá, hoje é o meu último dia aqui!!
Olá, hoje é o meu último dia aqui??
E sabes isso desde quando? Soubeste hoje? Ontem? Na sexta feira passada? Ganhaste na lotaria?
Que pessoas são estas que partilham uma vida connosco e de repente nos desconsideram assim?
Quando foi que nos partirmos?
Quando foi que deixamos de construir, de nos enganar?
Sinto pena.
Sinto pena quando penso que também eu, seguindo o desprezo, a raiva, os engulhos e a desconsideração crescente que todos vamos alimentando uns pelos outros, possa morrer assim de um dia para outro, sem sequer permitir que me façam o enterro.
Uva,
ResponderEliminarNem toda a gente gosta de socializar. Não é que sejam mal-educados ou não gostem dos colegas, simplesmente são assim. Gostam de estar na concha deles, a ideia de socializar é-lhes insuportável e, simplesmente, escolhem não o fazer. Compete, em minha opinião, às pessoas que os rodeiam perceber isso, aceitá-lo e não o sentir como uma desconsideração pessoal.
Para essas pessoas, um "amanhã é o meu ultimo dia" já é ir muito longe, por elas sairiam porta fora no ultimo dia sem mais conversas para quem fica. Sem que isso seja signifique despeito.
Há pessoas assim em todas as empresas. Claro que, estatisticamente, quanto maior a empresa, maior número haverá.
Por ser um bocadinho assim e me reservar cada vez mais (fruto, infelizmente, de más experiências), tenho profundo respeito e compreensão para com essas pessoas.
Totalmente de acordo contigo quando se trata de pessoas que 'efetivamente' não socializam.
EliminarNão era o caso.
Pessoas tímidas, que apenas se comunicam comigo por email, e com todos por email, e um bom dia muito sumido, ou mesmo um abanar de mão num cumprimento em frente à minha porta, onde vejo apenas isso, a mão, é coisa que já me habituei e tanto me faz.
As outras que trabalham comigo e falam comigo e têm assuntos comigo, almoçam comigo, etc, avisarem-me que se vão embora no último dia, é demais.
É uma desconsideração que me fere e atinge.
E não é só comigo que o fazem, outras também já o fizeram, e outras ainda o farão.
Mas isto não é para mim normal e era (mesmo nos casos em que só me apetece um cuspo no porta) incapaz de ir embora sem mais.
E não me consta que pessoas tímidas sejam mal educadas.
Já que não podem falar, não querem falar, por timidez ou outra coisa qualquer, ao menos que o digam por e-mail: olá, dentro de X dias, irei 'abraçar um novo projeto profissional'.
Simple as that!
E tens razão. N é normal. Se têm alguma ligação,ainda q fruto da convivência forçada,n acho mto normal.
EliminarRealmente impõem-se a questão, q tipo de pessoas são essas??!
Somos nós.
EliminarQue nos apegamos, Uva. Que nos apegamos....e, que, de repente, percebemos que não fizemos parte da vida dessas pessoas, que não se apegam. É assim querida Uva.
EliminarTemos que arranjar uma carapaça emocional, Uvinha!
ResponderEliminarBeijos. :)
E tenho, que tenho, aliás infelizmente tenho e tenho-a cada vez mais grossa.
EliminarMas preciso de desabafar. E estas coisas moiem-me os nervos.
A pessoa dá de si e depois é isto?
Mas continua a dar de ti (qb, pois claro) Felizmente nem todos são assim.
EliminarFelizmente isto tem um horário de saída.
EliminarBolas mulher, é assim tão mau, ou estás num dia mau? ;)
EliminarNão te quero responder porque hoje até não é dos dias piores. Hahahahahah
EliminarA resposta ficaria inquinada pela boa disposição.
Toma lá um abraço e prometo que se resolver ir passear para outros blogs e deixar o teu (como se isso fosse possível!!!) te aviso pessoalmente, ao vivo e a cores. ;)
ResponderEliminarPercebo-te bem, também me dou um bocado às pessoas e espero sempre um pequeno retorno, nem que seja esse acenar de mão, não sou muito de beijos ou abraços, relevo as palavras!
Estou ferida na minha dignidade de colega. Afinal o que vem a ser isto mesmo?
EliminarPontapés e caneladas dava eu aos meus colegas da primária quando não me chamavam para jogar a bola.
Já não somos crianças e a vida dá tantas voltas...
Não sei se é desconsideração. Se calhar é uma forma de poupar a todos. Hoje custou-te saber que aquela pessoa não vai voltar a trabalhar contigo. Se se tem sabido há mais tempo talvez andasses a sofrer desde então, porque quando nos apegamos às pessoas a ideia de despedida e o sofrimento que dela advém não vem ao quilo nem se distribui pelos dias - um quilo de sofrimento a dividir por trinta dias dá pouco mais de trinta gramas por dia. A verdade é quer seria um quilo de sofrimento todos os dias, durante trinta dias e os que se seguissem.
ResponderEliminarA alternativa é considerar que sim, foi desconsideração. Os quilos da separação continuarão a ter de ser suportados, acrescidos dos relativos ao ressentimento.
Julgo que foi desconsideração. Não altera em nada o sentimento que tinha e tenho pela pessoa. Gosto dela. Gostei sempre dela como pessoa e acho que é boa profissional.
EliminarMas desiludi-me.
E fui desconsiderada porque já todos sabiam, ou quase todos, menos eu.
Concordo plenamente com o primeiro comentário, quando não há uma relação. Quando há uma ligação em que inevitavelmente com o passar dos anos o lado profissional também se mistura com uma certa amizade, também não me faz sentido e é algo magoa. É que o sentimento que fica é que aquela pessoa esteve a comportar-se nos dias anteriores como se isso não fosse acontecer. Soa-me a engano e a fazer figura de parva. Mas isto sou eu que talvez sofra do mal contrário, que é o de achar que tenho placas na testa que me denunciam por não suportar colocar-me nesse papel de fingimento.
ResponderEliminarParece aquela sensação de andar a nadar a nadar e não saímos do mesmo lugar.
EliminarNas verdade não vamos para o trabalho para fazer amigos. Quem os faz tem muita sorte. Ter um amigo no trabalho é muito bom. É um ombro que ali está para te ouvir e para poderes apitar quando tens a fornalha cheia.
Resta-me dizer que o colega de trabalho é como o poeta que finge.
Deixá-la lá ir à vidinha. Espero que não lhe façam o mesmo.
Uva, boa noite.
ResponderEliminarSolidária com a tua desilusão, com os teus engulhos e com a tua raiva. O nosso local de trabalho, onde passamos mais horas do que na nossa casa, deve-nos, de algum modo, o devolver de um bem-estar, em contraponto com a nossa dedicação. Felizmente eu estou muito bem nesse segmento, e sei dar valor às pessoas que não podem sentir o mesmo.
Como não há milagres, e engolir sapos e engulhos é dificil, o melhor é blindar a tal carapaça que vais construindo, o que é uma pena que assim tenha de ser.
Abraço,
Mia
Verdade Mia. A pessoas vai aprendendo com as atitudes do outros. Mas é pena porque por estas e por outras é que estamos todos cada vez mais fechados e a angustia que sentimos no trabalho nem sequer tem a ver diretamente com os colegas.
EliminarPaga o justo pelo pecador.
Olha, Uva, quando cheguei aqui para escrever um comentário, vi as palavras do anónimo das 17h28, com as quais concordo.
ResponderEliminarDepois, deste uma explicação adicional e aí, sim, entendeu-se melhor a tua indignação. Se tinhas uma relação importante com essa pessoa, julgo que deverias falar com ela. Ou não, caso entendas que essa atitude foi mesmo fracturante.
É interessante constatar estas diferenças, pois, eu pertenço ao grupo dos que não gostam de socializar em contexto de trabalho. Nunca o fiz. Embora tenha dois ou três amigos, cuja amizade surgiu por via do trabalho. Se saísse amanhã ou depois, ou quando for... não aviso ninguém. De forma reservada, digo apenas aos meus amigos, onde se incluem os que nasceram por via do trabalho.
Já eu diria a toda a gente. Uma semana antes, duas.
EliminarOlá, vou-me embora. Gostei muito de a conhecer. Chuac chuac vamos falando.
No meu outro emprego avisei toda a gente e andei a despedir-me de todos, um a um, com a lágrima no olho.
Hoje não falo com ninguém há anos, mas ninguém me fez mal para lhes bater com a porta na cara e de repente: então a Uva? Não vem hoje? Não a Uva não vem mais. Despediu-se. Cabum!! Que coisa malcriada, ingrata e estúpida.
Para eu fazer, claro, na minha maneira de ver as coisas. Sempre tive empregos familiares, nada de multinacionais com 400 pessoas.
Eu fiquei cá a remoer em seco com a atitude.
Não gostei.
Se fosse a colega do 8º andar que só vejo nas festas de Natal, pois cagari cagaró. Já assim, achei possidónio.
Tenho por hábito não misturar relações de trabalho com relações pessoais pois diz-me a experiência de muitos anos de trabalho e de saber que esse mundo é uma selva onde só falta tirar olhos, que assim deve ser, mas sim, é inevitável ganhar afecto por algumas pessoas e sim, também me afectam as desconsiderações, no entanto já me vou habituando, como já disse ali atrás esse mundo do trabalho é uma selva e das perigosas... Não leves isso tão a peito, assim sofres menos. Bjs
ResponderEliminarMas Gaja, sobretudo por serem relações de trabalho, há coisas de trabalho que ficaram no ar. A pessoa tinha envolvimento com o meu trabalho. Trabalhava comigo há 4 anos. Qué lá isso? Onde é que se aprende a ser assim tão despegado?
EliminarÉ uma chapada do caneco.
Eu sou do bem.
Custam-me certas merdas pá! Fui educada assim, a ser gentil. O meu pai se soubesse que eu desaparecia do escritório sem dizer água vai, era bem capaz de me descompor e perguntar se lá em casa alguma vez tinha visto esse exemplo.
Não estranho,
ResponderEliminarse há quem a si próprio não se considere
como pode esse alguém considerar-te?
Desdramatiza!
Custa?
Claro!
Vou desdramatizar sim. Há mais marés que marinheiros.
EliminarApre!
Foi uma brisa que passou?...Também não acho normal, se havia uma relação, mesmo daquelas levianas que são de trabalho e não de amizade. Pelo menos eu sei que não o faria (e eu não sou pessoa de partilhar muito de mim - exceção feita para o niquinho de mim que partilho no blog)
ResponderEliminarFoi sim, uma brisa que passou, muito mal cheirosa. Mas é assim, já passou.
EliminarSiga para bingo!
(Mas por amor da santa, a pessoa passa 12 horas com esta gente todos os dias!)