21 de dezembro de 2015

Da maldade

Sou muito contrária à generalidade das pessoas.
Tudo me surpreende.
Ao contrário dos descrentes, aqueles que se dizem ter passado por muito, tanto que já nada os faz voltar a cabeça num trejeito de curiosidade - e que, quanto a mim, demonstrando uma apatia mais feroz do que as pedras da calçada - tenho pena.
Não sou assim. A mim tudo me seduz, tudo me entristece, tudo me afadiga. Ao virar da minha esquina está uma jovem romena envelhecida. Tem nas mãos um copo esticado que pede esmola. Olho para ela nos olhos, e vejo-lhe as mãos andrajosas, corrompidas. Sou a única que a olha. Já a ela, que me fita displicente e até mordaz, a minha imagem não lhe afadiga os pensamentos.
Estamos dormentes, mas eu ainda sinto os braços.
Hoje de manhã, quando sai para a rua: será possível? estarei a ver bem? Onde estão as árvores que davam cor a isto tudo, que aninhavam passarinhos, que sombreavam as esplanadas?
Todas cortadas rentes, sem novas oportunidades.
Maldade.
Mais à frente vi dois gatos cambaleantes, pequeninos. Têm fome, pensei.
Mas outros gatos jaziam mortos, ali perto, e os outros, ainda vivos, agonizavam esticando-se ao comprido no relvado, de olhos muito abertos.
Veneno.

Logo que cheguei ao escritório denunciei a situação.Os gatos foram todos envenenados porque faziam moscas.
Matam as moscas e mantém-se a merda.
As árvores foram definitivamente abatidas.
Sujavam as casas através das janelas, e uma comissão de moradores achou por bem um abaixo assinado.
Como se os moradores não convivessem bem com a merda que têm na cabeça.

 
Não entendo as pessoas.
Não percebo as cabeças.
Gosto tanto de árvores como gosto de animais.
E no entanto vejo-me rodeada de gente como cepos, animais em forma de gente.

Sois miseráveis.

8 comentários:

  1. Não digas animais em forma de gente...estás a fazer comparações com os animais que não merecem. Os animais são muito mais que isso. Nunca tomam a forma de gente.

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  2. De entre tudo isso, fico aliviada por não ter visto os gatinhos. O resto é mau, mas sei que essa imagem perseguir-me-ia durante semanas, tal como este post me vai perseguir o resto do dia. Não há outro nome para isso que não maldade.

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  3. Só consigo repetir, por não ter palavras, para tanta maldade

    A mim tudo me seduz, tudo me entristece, tudo me afadiga.
    Serão mais calhau que cepos
    Sois miseráveis

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  4. Que triste, sair á rua e depararmo-nos com tais maldades. Parece que hoje em dia se mata por duas razões: por tudo e por nada... :(

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  5. Sois?
    Cuidado com as generalizações
    Tino nessa língua
    menina!

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  6. Eu sou daquelas pessoas que diz sempre "ah, hoje em dia ja nada me surpreende/choca" mtas vezes em relação a determinada pessoa "ah vindo dela..."...mas, há sp um mas, depois dou sp por mim meia estarrecida com algo q fizeram/disseram...

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