17 de novembro de 2017

A MANHÃ

Estou viva. Que sorte.
Ainda ontem me emocionei com o simples facto de estarmos todos vivos e de saúde, vivendo a nossa vida calmamente, quase como se deslizássemos num espelho de água, sem fio de vento, sem nada.
Não estou mais gorda e a miúda cresce a olhos vistos. Está com o cabelo enorme, forte e saudável.
Impõe-se um corte valente, sob pena de gastos excessivos em shampoo e no tempo que se leva.
Dançava hoje em frente ao espelho, no seu fato de treino demasiado curto para as pernas, indiferente aos minutos que se acumulavam e encarniçavam à porta para saírem para a escola. O tempo é o que mais nos custa.
Há quanto tempo não danço?
Vivo na luz boa de Lisboa e o inverno está especialmente luminoso.
Saímos para a rua, muito agarradas uma à outra, porque é assim que tem de ser.
A comida da cantina está cada vez pior, mamã, os douradinhos de ontem foram os que sobraram da semana passada.
Gosto que me chame mamã.
Para que servem as mães? Foi a pergunta do caminho. As mães servem para ensinar as regras da vida, para dar mimos, e para explicar que não se devem levantar falsos testemunhos, nem mesmo contra os douradinhos.
Impõem-se um corte valente nos disparates da infância.
A escola, imponente e rodeada de árvores frondosas, é um deleite para a vista e um descanso para o coração. Parei um pouco para ver o casario, recuperado e pouco respeitador da traça antiga, e senti-me em casa.
Estou viva. Que sorte.
Posso caminhar ao longo da estrada e sentir de novo o sol nos cabelos.
Será isto a felicidade? 

5 comentários:

  1. Isso é, definitivamente, felicidade!

    Beijos, Uvinha ;)

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    1. Especialmente a parte: "Não estou mais gorda"

      Há lá maior felicidade??

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  2. Com essa descrição toda se não é felicidade, então não sei o que seja, mas acredito que muitos a ler isto .darão por si a achar algo diferente

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    1. se calhar aquele tipo de pessoas que compra o "Domesticália" terão outras noções, outras sensibilidades, a achar isso blasé, que ser feliz com o que a vida dá sem gastar dinheiro em algo chiquérrimo ou fino, tipo isso.

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