23 de junho de 2015

Do usufruto

Ainda não sei muito bem o que pensar sobre o teu novo hit.
Percebo que sejas uma mãe babada, que queiras mostrar o fruto do teu trabalho, o esmero da tua educação, a fibra da qual és feita. 
Foste uma filha medíocre mas não estás para aí virada quando se trata do teu filho. 
É um trunfo que deves aproveitar, afinal é ele que te vai pagar o lar.
Sim, entendo, não é por mal, os adultos começam a ficar sem fichas para apostar, afinal já se expuseram totalmente aos outros, já toda a gente sabe onde moram, com quem namoraram, o que comem ao petisco, como está a barriga e as mamas depois da gravidez, que praia frequentam, que país visitaram, que medos os apoquentam, se gostam ou não dos biquínis folhados e florificados que as moças agora usam, qual a posição para engravidar mais depressa, talvez esta assim, de perninhas para o ar depois do acto, e voi-lá, contigo até resultou e até metes a fotografia, e que tal a tatoo com o nome do herdeiro mesmo por cima das mamas, amor eterno, dependência eterna.
Acredito muito que promoveres uma imagem, a apitar nos 40, é algo verdadeiramente difícil, e até muitas vezes impossível, quando o sucesso profissional, familiar e social é precário ou inexistente, quando toda a gente já sabe que não falas com a tua irmã vai para dois anos, que te divorciaste porque demonstravas mais amor pelas tuas unhas de gel do que pelo rapaz, que não trocas de carro há 10 anos porque esse que tens é pago pelo teu pai, que o teu cão afinal é um rafeiro muito mal cruzado mas que não, que te custou 700 euros que ainda estás a pagar, que a tua pele desdenha de ti, como a tua conta bancária desdenha das coisas que não podes pagar, porque vives no subúrbio e és fã do frango assado, ou porque o teu novo companheiro não foi além da linha de produção, e que tu, afinal, não chegaste a acabar o nono porque enfim, não davas muito para a escola.
Mas, tens um filho, um hit, e novas oportunidades se abrem à tua frente.
Apostas forte na educação do gaiato, empreendes que a vida dele há-de ser só escola, escola pelos olhos, pelas orelhas, pela testa, empreendes que ele há-de ser campeão de judo, futebol, voleibol, natação e danças de salão, contando que em alguma coisa ele acabará por sair-se bem, e que nem que a vaca tussa ele há-de ser exatamente aquilo que pensaste para ele, mesmo que o pobre menino já não se aguente nas canetas.
Cuidas que é muito bonito espetares com as notas do miúdo no facebook, com o rabo do miúdo no facebook, com a pilinha do miúdo no facebook, como se ele fosse um toiro de feira, para demonstração do teu ego petulante, para tua própria vaidade.
Não tardará muito que numa próxima visita ao médico não aproveites também para colocar o resultado das análises ao sangue do menino, ou mais tarde, quando o menino estiver para se casar mas a mulher não estiver para filhos, não lhe ponhas também o resultado que obteve na avaliação dos espermatozóides, e que rápidos, e que potentes, sai à avó que o avô nem espermatozóides tinha.
Nós, os humanos em geral, a família e os vizinhos em particular, temos um verdadeiro interesse em saber que o intestino do menino trabalha muito bem, que tem três namoradas nas danças de salão e que até lhes apalpa o rabo, assim é que é rapaz, fura bolos, fura todas.
Ñisso e nas notas que o puto teve na 2ª classe. 
Já se sabe a importãncia que isso tem para a média.
Da tua própria avaliação.
 

27 comentários:

  1. Na mouche, Uvinha.
    (O título é propositado?)

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    1. O titulo é obviamente propositado. Tem os filhos para usufruírem dos frutos que eles lhes dão.

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    2. O título tinha um erro. Deu conta a LP e mesmo com o teu aviso não entendi. Tás pior Uva. Obrigada às duas.

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  2. Com que cara dirão elas aos filhos que a internet pode ser perigosa? Para não se exporem, que ele há coisas que são mesmo só nossas?
    Abraço, gosto muito de ti, Uva nada Passa

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    1. Abraço já de imediato, antes que se faça tarde! É recíproco.

      Já não há coisas 'só nossas', Picante, hoje em dia é tudo público.
      Oiço dizer que na caldas da Rainha medem as pilas ao putos e que há uma competição desde que entram na primária sobre o tema. Que circulam os tamanhos da pilinhas dos garotos entre os pais para entregarem bem as raparigas. Um fartote.
      É falso, suponho. Não quero acreditar, apesar de me terem contado esta história de forma bastante séria e até mais do que uma pessoa.
      Era só o que faltava.
      A minha mãe punha as minhas notas no facebook e eu ficava de trombas 3 anos de seguida. Que vergonha, embandeirar assim os filhos para proveito próprio.

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    2. E a gala q fazem dessas merdas nos locais de trabalho (das notas, não das pilas). É q fico logo mal disposta qd começam com essa conversa, alto e bom som, p q todos possam ouvir como são espertos os seus petizes.

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    3. Não há pachorra. Eu nem 1 minuto. Já não posso ouvir falar da escola.
      ML ESTÁ DE FÉRIAS!!!!!!
      Para o ano há mais. Agora CHEGA!

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    4. Olha, posso dizer q já passei por mau feitio lá no estaminé, à conta dessas mer**. Digamos q a máquina do café estava demasiado perto da minha pessoa (ainda está, mas agora há outra, e vá-se lá saber pq, agora n ficam ao pé de mim...q pena (not))

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    5. Pois, é preciso ter calma. Cá em casa já se destruíram 234566778 máquinas. ;)

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  3. Mas agora é isto o dia inteiro???
    Hoje foi a manhã inteira a receber notificações com as notas dos meninos no facebook.
    Notas da 2ª classe, até da pré-primária, fosga-se, que interesse é que isso pode ter? Expor assim as competências dos filhos?
    Houve lá uma que até a merda do papel falsificou só para não ficar atrás das outras nas notas do filho.
    Onde andam as mães dos meninos que tiveram insuficientes e 3? Estão todas no psicólogo ou juntaram-se numa seita e foram todas juntas cortar os pulsos?
    Mas que coisa sinistra!

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  4. Falsificaram o boletim de notas para efeitos de FB?! Eh pah, isto está pior do que eu imaginava!

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  5. Ahh pois! Completamente. Um mapinha em excel todo amanhadinho (mas escondendo o nome da escola e da professora e tal) e toca de lá por tudo corrido a cincos que o menino é o novo Einstein, que coitadinho só quer é estudar. Só que não.
    Que tristeza. E foi apanhada.

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  6. Querida Uva Passa,
    Nem sei se lhe releve a acutilância se a hilaridade. Ambas.
    Um beijo,
    Outro Ente.

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    1. Esta grande parvoíce não é nada hilariante.
      Temos tudo virado do avesso, e no entanto, rir para não chorar, chorar para não pirar!
      Um abraço (par)Ente.

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  7. Tenho uma pessoa na família que estudou até à 4ªclasse e é uma verdadeira militar com as notas dos filhos. Por acaso "teve sorte" e os miúdos são espertos como o caraças, com prémios nas olimpíadas das matemáticas e afins sem estimulo nenhum dos pais que nunca se sentam a estudar com eles, mas fico sempre imensamente triste de ver a forma como ela os trata. Se têm muito bom é porque não tiveram excelente e por aí fora. De vez em quando não aguento e dou-lhe a dica mas ela cala-se e continua a fazer o mesmo, porque o que interessa é que eles brilhem, não interessa a que custo. Faço sempre questão de nunca lhes perguntar nada das notas. Pergunto coisas como "então, gostas dos teus novos amigos?" ou então "agora que a escola acabou vai ser a desforra!" sem querer saber para nada dos resultados para que eles tentem perceber que pelo menos aos olhos de outros são tão mais do que isso.

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    1. Ui, essas mamãs que filtram os miúdos para serem os melhores são (quanto a mim) demoníacas.
      Roubam a infância aos miúdos, incutem neles um competitividade feia, mal formada, desadequada.
      Livrem-me de fazer isso à minha. E se fizer, internem-me. Nesta altura está de férias, dorme até ao meio dia, brinca, come gelados, anda descalça, no Alentejo.
      Algumas outras, muitas, aproveitam para meter os putos os centros de estudos para os preparar desde já para o 'novo ano que aí vem'.
      Credo, mas vale um colégio interno.
      Aliás, mais valem dois.

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  8. Falava agora com uma amiga sobre os pedidos absurdos das crianças e ela contou-me isto sobre o filho. Acabou o ano com tudo corrido a 5 e apenas dois 4, a mãe perguntou-lhe que presente queria "dentro das suas possibilidades" que não são muitas, o miúdo respondeu que queria apenas um beijo e um abraço.

    (O texto está maravilhoso como sempre!)

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    1. Vês, até há miúdos que nem ligam a merdas. Acho bem. Não são todos iguais e isso é bom.
      E nem as mães são todas iguais. Há mães que ainda olham para as crianças e vêem apenas crianças.
      Não carros de corrida.

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    2. Por acaso n nego q tenho sentimentos contraditórios relativamente a essa coisa da "recompensa" pelas boas notas... Um dia deste disserto sobre isso. Ou então não. :)

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    3. Já dizia o meu pai (que ainda hoje, pai de duas filhas de 31 e 36, revira os olhos aos paizinhos que batem no peito porque os seus filhos são os maiores/melhores) que eu não fazia mais do que a minha obrigação, qual recompensa por tirar boas notas!! Hoje percebo-o tão bem... e agradeço-lhe tanto!!:)

      Susana

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  9. Ai jasus, mas em q meandros andas tu metida uvinha??!

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  10. Nem sei o diga diga que os meus estão a tirar uma licenciatura em ramboia e não ligam nada ao que lhes digo. Nem no facebook posso por uma notinha que seja. Era logo expulsa do clube das mães ,,,

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    1. Fazem que não ligam, mas ligam. Estão a gravar tudo. vai por mim.

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  11. Eu acho que isto sempre se fez, só que antigamente era mais "local" (também não havia facebook).

    Por exemplo, lembro-me da minha avó (mãe da minha mãe) e que nunca gostou de mim nem me tratava bem, passar a vida a gabar-se das minhas notas às pessoas da aldeia. E eu detestava! Principalmente porque senti desde muito cedo que não vali nada para ela, exceptuando se lhe valesse para ela se gabar aos outros.

    E eu era muito inteligente mas muito mal educada (segundo a sua perspectiva) porque um dia quando se lembrou de mostrar um dos meus testes de matemática - teria eu uns 11/12 anos - eu, que já lhe tinha pedido para não o mostrar (porque ela tinha o vicio de "desvirar" todos os meus pertences pessoais à procura das minhas coisas para mostrar aos outros ou para dar aos meus primos), cheguei à beira dela, tirei-o e fugi.

    Mas eu nunca me arrependi de o fazer! (é a mal educada que há em mim :D )

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    1. Não eras mal educada. Eras mal compreendida. Também fui assim durante muito tempo. Mas eu era por toda a família. Só a minha avó é que gostava de mim. O resto tinha uma ideia entre o horrível e o terrível a meu respeito.
      Caga nisso.

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