31 de agosto de 2015

Da insuspeição

Se fossemos capazes de prever, ou mesmo de presumir, que as coisas são como são, que nós somos como somos, e assim também todas as coisas viventes que nos acompanham no caminho, deveríamos resignar-nos à evidência de que o que nos é reservado, para quem acredita no destino, ou o que nos calhará em sorte, para quem não acredita no merecimento, é tudo menos certo.
Na maioria dos casos, quando uma pessoa que julgamos como pessoa que é se nos apresenta como outra pessoa - lembro-me por exemplo dos escritores que escrevem sob heterónimos, das religiosas que acabam casadas com o padre, com a amiga que afinal nos anda a comer o marido, com o Ministro que afinal tem milhões no bolso das calças, - é fácil arranjar uma solução à medida: prende-se o político ladrão, excomunga-se o padre, esbofeteia-se o marido; mas quando esse, digamos que, desvio, se desenvolve num animal, alto! que temos fado e missa cantada.
Quem havia de supor, se as coisas são como são, que a minha gata já era, quer dizer, já foi, ou melhor, nunca chegou a ser?
Eu não tinha suspeitas de nada, e daí o titulo, que a gata Mequinhas não seria por si só uma verdadeira gatinha, e na verdade qualquer conjetura de que este bicho de longos bigodes hirsutos é ou pode vir a ser uma verdadeira gatinha, torna-se facilmente arbitrária e totalmente carente de fundamento real.
Mas os homens, habituados a presumir, a acreditar na sorte, e a considerar o merecimento apenas quando desenvolvem ações superlativas, vêm-se em palpos de aranha (que é exatamente onde me vejo), quando chegam à triste conclusão que não nos basta fé e força para interiorizar que afinal as coisas, no caso a gata, não são como são.

A gata não é como é, e está a muitas léguas de ser como deveria ser.
Que ela é má como as cobras, dá saltos como as cabras, e morde como os cães!
Help, I´m arrasquinha!









Aqui nesta foto não está tal e qual o Don Corleone?

27 de agosto de 2015

Adeus Gerês. Olá Piódão!

Ninguém consegue imaginar o que sente alguém com a terrível fobia das alturas, o medo da queda iminente incrustado na pele, os músculos doridos de tão tensos que viajam, e fazer, só para realizar um sonho muito antigo, as estradas que serpenteiam a Serra do Açor - mais alta que a lua -, no caminho Sobral Gordo - Piódão - Sobral Gordo, numa caranguejola com quase 10 anos no rabo, que passou praticamente as férias todas entre a 1ª e a 3ª velocidades, relinchando nuns pneus que tiveram de ser todos substituídos algures no Porto.
Sente medo.
E cansaço.
E alegria.
Quatro dias sem rede no telemóvel, sem ligação ou notícias do mundo, sem poluição, sem ruído dentro da cabeça.
Na Serra só a vaga e madrugadora buzina da carrinha do pão, do peixe ou das mercearias, que parava na aldeola mais profunda da serra, com 32 pessoas residentes (e mais três turistas) para trazer o que é para todas elas impossível de ir buscar.
Foi uma viagem muito bonita, toda revestida de natureza.
Voltaremos um dia, quando me esquecer do medo que tive.


Eu a dizer à ML o tanto que precisávamos percorrer para chegar à aldeia de xisto mais bonita de Portugal.
Piódão.


Lá em baixo, a aldeia que nos acolheu de forma tão especial. Sobral Gordo.
Parece uma brincadeira de crianças, a vista assim, imensa, que deixa descobrir a Serra da Estrela - mas não é. É absolutamente deslumbrante e ficará para sempre na minha recordação.
Obrigada Su, pela tua simpatia e por teres aberto a portas da tua casa.


O caminho que descobrimos levou-nos a um lugar que vale tudo a pena.
Uma cascata no meio da Serra.
Fraga da Pena.






Piódão!
Finalmente!
Tão pequenina, mas tão bonita.





Depois de tanto quilometro percorrido, tanto stress por causa das alturas, a respiração entre-cortada, o coração descontrolado, sobretudo na descida onde a condução se faz sempre por fora do caminho, a um milímetro da ravina, muito mais perigosa, um tanto ou quanto louca, nada como uma bela sopa no Barril, perto de Côja.


E fim!
Cheguei novamente ao ponto de partida.
A Casa dos Pinheiros triste e fria, cerrou-se de nevoeiro para me receber e quase me fazer esquecer os dias quentes que passei em viagem.


Adeus férias. Olá Rule of Law...

22 de agosto de 2015

Adeus Lagoa de Albufeira. Olá Gerês!



Caiu a noite na Casa dos Pinheiros.
Até o vento se foi embora, cansado de tanta correria, de tanto remoinho.
Gosto demais deste sítio, mas ele é tão absolutamente meu, de mim, que mesmo na partida o levo comigo.
Este ano, como é tradicional, fizemos três grandes festas com amigos - em dias alternados, para secar a loiçaria. Os amigos que antes apareciam de toalha ao ombro depois da praia (lembro-me tão bem desses corpinhos magros e pretos) para comer e beber basicamente o que houvesse, cresceram, multiplicaram-se, e trouxeram com eles, envoltas nas toalhas, especiarias e bom vinho para partilhar com os da casa. Tardes quentes esparramadas na relva, cacholeira de Alpalhão, sardinhas e entremeada a assar no grelhador, e para mim, que sou a que mais gosto, diversas cores nas garrafas geladas de Lambrusco, em permanente tchim-tchim, sobretudo ao futuro da Casa dos Pinheiros, agora mais esperançoso.
Fiz mais de 70 km em cima da minha bina vermelha de 20kg, e voltei ao Portinho da Arrábida para me alambazar nas rochas que determinam o fim da praia e que me fazem lembrar o Algarve e as lapas que o meu pai apanhava.
Tudo coisas muito minhas, que adoro, mas agora urge caminhar.
Adeus Lagoa de Albufeira.

Olá Gerês!



Que maravilhosa terra.
Que estranho verde (também o vinho) que se entranha na memória e nos faz querer voltar, ou não sair, nunca mais, de perto, de dentro, de cima, da imensa serra.
E que serra.
E os cavalos garranos e selvagens que se atravessam na estrada, bufando ferozmente a natureza?
E as vacas amarelas de grandes cornos repenicados que lambem as vidraças, chocalhando leite e tinindo chocalhos?
E o verde (também o vinho)?
E as cascatas (também de vinho)?
Esta é a Cascata do Tahiti, de acesso complicado na parte inicial, mas que qualquer pessoa com agilidade e mobilidade faz sem problemas, e que nos leva a uma pequena lagoa natural onde fomos encontrar uma panóplia de nacionalidades que se banhavam agarradas às GoPro, com um olho nas formosuras, e outro nas geleiras, cheias, que esta gente é de alimento!







A estadia:


O hotel foi uma agradável surpresa. Marcado às três pancadas no Booking, foi na verdade um tiro muito certeiro.
Com duas frentes esplendorosas para a barragem do Cávado, uma piscina de água aquecida pelo sol de todo o dia, perto de tudo, e sobretudo a gerência perto de nós, gente da terra que gere o espaço há mais de 20 anos, com um grande e franco sorriso, como se fossemos amigos de sempre.
A voltar, quem sabe, para o ano, com os amigos.


A praia do hotel. Barragem do Cávado.
São permitidos desportos náuticos a motor, e para a gaiatada é do melhor que há com imensas atividades radicais, tudo saudável.
Há muita gente, é verdade, sobretudo nesta zona da barragem, mas eu gosto de pessoas. Não me importo nada. Eles estão lá, mas eu também lá estou.
Com respeito e organização, cabemos todos.


A esplanada do hotel tem assim a vista melhor do mundo!
O pequeno almoço tomado aqui, na sombrinha do chapéu, até sabe melhor!
O nosso pequeno almoço são duas fatias de pão com queijo, café preto ou leite simples e toca a mexer que o tempo é pouco!



A paisagem em frente ao restaurante 'O Abocanhado', é de tirar o fôlego. Depois de muito zigue-zague pela serra (Jasus!!!), o caminho desemboca aqui, num pedaço de paraíso.
O restaurante é caro, mas as refeições são deliciosas, o vinho ui upa ui ui, e aquele bacalhau tibornado com morcela e broa de centeio frita em azeite, é qualquer coisa de surreal.
É precisamente nestas alturas que eu gostava de ser rica.
Seria uma debulhadora-barril com duas pernas, ou estaria desdentada com tanto mastigar.



Uma barragem que mais parece o paraíso, em Vilarinho das Furnas.
Tão mas tão boa, a agua tão quente, o vento tão sereno. Fui ao céu e voltei. Foi pena. Uma pessoa quer morrer e não pode.Aqui sim, pouca gente no pedaço. Dá para ir de bicicleta serpenteando a barragem, e de carro também dá, mediante pagamento (3 euros).
Tem sitio para merendar e local próprio para fazer churrasco. Ideal para passar o dia em família. Muita coisa para descobrir. Sítios ótimos para namorar.


Ai que saudades que vou ter deste acordar.
Fico de olho nisto!!


Agora as paragens serão outras.
O tempo vai arrefecer.
A ver se ainda consigo dar mais alguns mergulhos no meu Portugal!
A ver vamos!
Abraços a todos.

13 de agosto de 2015

El Camiño...

 ... se hace pedalando.

António Machado (1875 – 1939) não o disse desta forma. 
Em 1875 poucas seriam as donzelas que despiam os seus vestidos no final de um extenuante baile - onde dançavam com duas ou três matronas de pés de chumbo, enchoiriçaras dentro de fardas militares a cheirar a nafetalina, que as obrigavam a voltas e reviravoltas na barriga das pernas -, para se equiparem a rigor como manda o figurino, envergarem umas meias pretas de futebolista reforçadas nas canelas (e já lá vão 3 bisnagas de Trombocid), calçassem uns ténes de cor muito duvidosa, umas calçonetas que está visto servirem muito bem mas para outro tipo de desportos, nomeadamente dormir a sesta, e que alapassem os rabos de donzelas num selim escanifobético que mais parece um saca rabos, para pedalar 21 km/dia (mais coisa menos coisa) nos montes e vales entre a Lagoa de Albufeira e Alfarim, com uma bicicleta feita dos restos dos tubos de ferro aventados pela Siderurgia Nacional.

E estou branca como a cal (como se pode ver pelas fotos tiradas pelo meu carro vassoura), but frankly my dear i don't give a damn!!




Aqui a Uva a olhar com muita atenção para a Praia do Rio da Prata (naturismo) para ver se avista algum gambozino perdido no areal. 
O acesso a esta praia (que agora não me lembro o nome) faz-se por uma estradinha secundária logo em frente às bombas da BP (à entrada de Alfarim) e é muito fixolas porque é super sossegada, tem um enorme passadiço mesmo até ao areal, pouca gente (mesmo), e grande espaço para estacionamento.  
Conheço a praia desde miúda mas nunca lá tinha ido de bicicleta (nem em sonhos) e nunca a tinha visto assim arranjada e com o acesso tão facilitado.
Sempre a evoluir o meu querido concelho de Sesimbra!
Let's keep rolling.
Amanhã há mais.

7 de agosto de 2015

Férias Grandes

Isso mesmo que estais pensando!

A dona da canastra vai apregoar as sardinhas e os carapaus para outras bandas.
Peixe-Espada-à-Cinta parece-me um ótimo local para montar a barraquinha.
A clientela aqui da cidade anda muito chocha, ninguém aqui aparece, isto está praticamente ao abandono, e assim ninguém sobrevive.
Eu por exemplo ando muito obcecada com o contador de visitas e o analista disse-me para me afastar desse besidróglio do demo pelo menos 3 semanas. 
A ver vamos se consigo tal proeza.
Vou passar uns dias fora do cubículo, deste cubículo de onde vos escrevo ainda, e que já me deixa saudades só-que-não, e vou espraiar as perninhas por outros areais, e pedais, vou tirar fotografias aos meus dedos dos pés imersos nas águas cristalinas do Atlântico, mas é para enviar ao meu quiroprático porque acho que um início muito bravo de joanetes anda aqui a querer ser gente, vou beber jolas e comer caracóis até dizer que já chega mas não quero encher-vos de fotografias de pratos com água castanha e restos de cocós de caracol riscado, e copos de cerveja ou lá o que se bebe nas férias, cheios de baba, e vou também fazer outras coisas imensamente aborrecidas e chatas e sem interesse nenhum, pelo que sendo vossa amiga, vos pouparei o mais que possa às minhas férias.
Um post ou outro só para dizer que estou bronzeada, tonificada, linda, que já pedalei 12568 km  ou mais, e pouco mais.
Sede imensamente felizes, aproveitai este maravilhoso Portugal, aproveitai os vossos filhos ao máximo, os vossos cães ao máximo, os vossos gatos... bom, eles é que se aproveitam desta treta toda mas sim, aproveitai-os a eles também, e leiam livros, que música teremos com fartura nas eleições.
Deixo-vos aqui um ensinamento do M. Kundera para quem estiver tentado naquela coisa do Karl Ove Knausgård e A Morte do Pai ou de como ele deu cabo da família em 4 livros:

» Quando um romance abandona os seus temas, e se contenta com o contar da história, torna-se inexpressivo.«

Querem livros para ler nas férias mesmo bons, memoráveis?

- Os Anjos Morrem das Nossas Feridas, de Yasmina Khadra
- Que Importa a Fúria do Mar, de Ana Margarida de Carvalho
- A Amiga Genial, de Elena Ferrante

- Crime e Castigo, de Fiódor Dostoiévski
- O Processo, de Franz Kafka
- A Taberna, de Émile Zola

Deixo-vos aqui um desenho que não sei quem fez, mas imaginem a Uva ali, de paraquedas, com as perninas e os bracinhos todos abertos, a lançar-se na imensidão.
Como não sou capaz de voar não poderei dizer que o céu é o limite, mas posso, se eu quiser, fazer a coisa ao contrário: o mundo, as pessoas, os sítios, são o limite! Vamos a isso!
Se o paraquedas não abrir, pois há de ser um valente mergulho.
Cabum!

 Westerdok Disctrict, Amsterdam

6 de agosto de 2015

Depressão Vs. Ansiedade

 Na UpToLisbonKids de hoje.



Gostava de explicar isto bem.
Tentarei ser clara na minha pretensão.

A depressão é o excesso de passado. A ansiedade é o excesso de futuro. (Junia Bretas)
Na medida em que todos temos um passado e imaginamos um futuro, a diferença entre ser depressivo e ansioso reside no tempo que despendemos a pensar num ou noutro extremo.
Se pensamos muito no passado somos depressivos, se pensamos muito no futuro, somos ansiosos.
As pessoas tendem a acomodar-se num ou noutro extremo da vida.
Foi sempre assim.

Desengane-se aquele que pensa que o desequilibro é coisa moderna, que só agora é que as pessoas pendem, ora para um lado, ora para o outro - dependendo do estilo de vida e da fase da vida -, enquanto antigamente todos caminhavam a par, muito centrados e muito equilibrados, sem ansiedades ou depressões, sem stress, e sem analista.
Não é um problema das novas sociedades, não chega sequer a ser um problema sociológico. É uma fraqueza individual, antiquíssima.
A humanidade é naturalmente depressiva ou ansiosa, desde sempre.
Eu não sou depressiva porque me sobra tempo para depressões. Eu não sou depressiva porque não tenho nada para fazer. Eu sou depressiva porque já fiz.
E também não sou ansiosa porque sou insegura ou demasiado perfecionista, assoberbada, hiperativa. Eu sou ansiosa porque ainda vou fazer e não sei como fazê-lo.

Há almas mais propensas em acumular o lixo do passado, em revolver os restos nauseabundos deixados pelos outros, e por si próprios, e que teimam em retificar e curar mentalmente algo que já não podem alcançar.
Um bom exemplo para esta tendência, para esta dependência do passado, é bem visível nas pessoas que insistem em fotografar os momentos todos da vida. Mais tarde, inevitavelmente vão perceber que as fotografias que tiraram impediram-nas de certa forma de viver o momento, de saborear aquele prato, de sentir aquele beijo. Elas não querem beijar, elas querem é fotografar maravilhosamente o beijo. E vão lançar-se e colar-se ao passado fotográfico, substituindo memórias efetivas e reais por momentos-em-clic, e vão ficar terrivelmente deprimidas de os terem apenas na superficial retina e não na meninge. E ficarão ainda mais deprimidas porque terão sempre a pulsão de ir ver as fotografias que tiraram, imensas, no passado. E andam sistematicamente naquilo, depressivas, a perpetuar o que já aconteceu e que na realidade não aconteceu nada.
Entendam que há acontecimentos que devem ser esquecidos (para bem do presente) e há outros que não foram sequer acontecimentos.
Se fosse saudável ao ser humano registar e guardar para sempre todos os momentos da vida passada, a memória fotográfica não seria considerada um distúrbio mental, e todos a teríamos mais ou menos desenvolvida.
O mesmo para o passado. É saudável reviver passagens do passado. É depressivo passar a vida nesse estado.

Outros há que preferem descerrar o futuro, saber mais sobre o que aí vem. Não percebo claramente se é para se prepararem melhor, se para se acomodarem melhor.
E vão aos magotes consultar videntes, e bruxas, e fazem simpatias, e cosem a boca ao sapo, e desejam mal aos outros para bem deles próprios, e fazem promessas e pagam promessas, para no futuro, quem sabe - não acredito em bruxas mas... -, viverem então muito bem com isso, com a falsa consciência que andam aí a fazer pela vida.
Ah, afinal sempre vou comprar a casa nova. Está escrito nas cartas. Deixa-me enfim descansar que o que é meu às minhas mãos chegará.
Há de ser tarde que a casa chega.
Mas cedo virão as ansiedades porque para se ser remediadamente feliz no presente (não pedimos mais que isso) é necessário lembrar como é que fizemos no passado, e se insistirmos em castelos de cartas, ideias sem ação, vidência e expetativa celeste nada irá acontecer.
Nada se faz se não for efetivamente feito.
É um cliché, mas a verdade é que a felicidade não é uma nuvem no ar que apanhamos aos saltinhos. A felicidade é uma coisa que construímos desde o chão, de joelhos e dores nas costas.

Então quer dizer que os únicos culpados pelas nossas tristezas (ansiosas ou depressivas) são precisamente aquelas que não conseguiremos, jamais, controlar?
Do que nos serve ficar dias e dias a remoer no passado, ou dias e dias a conjeturar o futuro?
Não será então a cura para tantos estados de tristeza o enaltecimento do presente? Da simples avaliação do agora? O que tenho agora? O que faço agora? Quem sou eu neste momento? Como reconstruir-me para que as minhas memórias do passado [as que construo agora] não sejam de tal forma penosas que me levem, outra vez, para um estado de depressão?
Tudo o que fazemos agora fará parte do nosso passado. Convém fazer o melhor que podemos e sabemos para evitar arrependimentos e falsos positivos para doença mental.
É preciso construir muito bem o presente, que no futuro não será mais do que o passado, e é ao passado que vamos buscar todas as nossas motivações.

Lamento muito que a classe médica insista em embriagar o paciente depressivo e ansioso com drogas fortíssimas e entorpecentes.
A droga vai adormecê-lo e vai apagar-lhe o presente, que em última instância é a única coisa que tem de melhor para consegui desligar-se do que já passou (e que é mau e deprime) e do que ainda está para vir (que é possivelmente mau, o que me deixa ansioso), e ainda o que lhe dá a motivação para o futuro.
Que futuro então, para quem não tem senão uma ténue recordação do presente?
Que futuro para todos nós, eternamente e geneticamente depressivos e ansiosos?
Não estaremos todos a fraquejar? Não estaremos nós todos inundados de drogas que supostamente nos salvam do nosso passado e nos protegem do nosso futuro, imaginariamente?
É que eu já não consigo suportar mais o espetáculo da nossa fraqueza.

Porque eu consigo entender D. Quixote sem conhecer a história de Espanha, no caso o seu imenso passado, mas não conseguirei nunca entendê-lo se não lhe (re)conhecer as ideias e as motivações que o fazem agir perante mim, agora, e assim esgrimir com o futuro a lógica da Humanidade.
E a lógica é só uma.
Avançar.
Sem medo dos mortos e sem medo dos que ainda estão por nascer.
Carpe Diem.


Trabalho (extraordinário) de fotografia de José Ð Almeida.