28 de julho de 2016

Arco do Cego ou daquele que não quer ver?

 A minha cidade é Lisboa, e é esta Lisboa que eu amo.


Bom, não será assim um amor tão avassalador porquanto a cidade foi tomada, também pelo coração, por estrangeiros e salteadores, que teimam em fazê-la sua, e ela, lisonjeada porque vaidosa, como o são todas as mulheres bonitas, está de certa forma indecisa.
Não sei se coma se marisque, e andamos nisto, ela e nós, no não sei se me internacionalizo ou se fico de vez no Sporting a florir em verde.
Já a morte se apresenta da mesma maneira, indecisa, quando quer ser pungente, quando quer cravar o arado na terra seca, que não dá em nada, deixando-a toda revoltada. A indecisão da morte, o nem o pai morre nem agente almoça, é sem dúvida o pior desta cidade.
Os homens importantes cá da terra reúnem imenso com os munícipes, pelo menos com aqueles que conseguem ir às reuniões de Câmara às duas da tarde e no meio da semana de trabalho, e estão para ali todos no palanque, imensos, a falar bonito, mas só a dizer merda.
Moram todos em Carcavelos e não frequentam as esplanadas com vista para o desatino que vai nesta cidade.
Esta conversa não faz sentido absolutamente nenhum se não vos contar que na 4ª feira passada se votou o novo Regulamento para o Funcionamento dos Horários da cidade de Lisboa, com 40 marmanjos a debitar parvidades e a aprovar relatividades, e os 'Aqui Mora Gente' desta vida, a postar postas de Facebook, na respetiva rede, mas bom senso que é bonito, nada.
Veio tudo à rede, mas nada daquilo era peixe, pelo que ficou a cidade mais esfomeada, e nós que por aqui moramos, cá ficámos com os despojos da grande pescaria.
Esplanadas que podem estar abertas até às 3 e 4 da manhã, com o argumento que assim se controla melhor o espaço público, foram algumas das tiradas mais líricas.
Uma esplanaducha ali na sobre-loja do meu prédio, a bombar cerveja até às três da matina, fora o tempo que levam a sair dali depois do fecho, é muito mau para quem trabalha, mas ótimo para os que sofrem de insónia. Jardins maravilhosos onde os cães rasgam patas diariamente nas garrafas partidas, é mau para o cão e respetivo dono, mas ótimo para o negócio veterinário.
E é assim, com esta ligeireza paternalista que se decide o destino da menina e moça.
 
As imagens infra podem ser muito duras para pessoas sensíveis.
É o Jardim do Arco do Cego todas as manhãs, depois da euforia da cerveja a 0.50€.
Os estabelecimentos que vendem as cervejas eram obrigados a fechar à 21h, não tinham esplanada, e isto ficava assim.  Agora vão fechar às 03h da manhã, com esplanada!

Fotos daqui!!

A minha cidade é Lisboa, e é esta Lisboa que eu amo.
Se esta merda é Lisboa, vou ali e já não venho.

26 de julho de 2016

Da maternidade (ou da miopia)


Sim.
É uma burra a olhar para um palácio.
Fora isto, que é evidente, sou eu, em Nisa, a olhar para uma maternidade.
De aranhas!
São milhares de pequenas teias de aranha, cagulo de bebés-aranha, cada berço contendo em média duas pequeninas moscas e três mosquitos, um silêncio de morte, pequeninas mas mortíferas, tudo de tocaia à espera de outros seres voadores miopes como eu, que lá foram meter o nariz, e olha, ficaram lá para sempre.
A curiosidade não mata só os gatos.
Há outros animais igualmente inteligentes...

25 de julho de 2016

Então e esse fim de semana de calor, hum?



Numa boa!
Saíamos antes das 8h para apanhar algum 'fresco', e ainda a Vila de Nisa não tinha acordado para o inferno que se pôs no sábado, com o termómetro a apitar nos 42º,  e já a Uva pedalava pela Circular Multidesportiva daquela vila alentejana, cumprindo a totalidade dos 32 km que se lhe impuseram, qual Dante defronte dos infiéis.
E que Dante!
Pedalar em Nisa era um objetivo antigo, que se previa de máxima dureza, mas que se impunha sobremaneira, não só pelas paisagens belíssimas do Alto Alentejo mas principalmente porque perdi 2163 calorias em 3 horas de exercício, e isto foi importante para este início de época balnear, sobretudo na zona do nalguedo que já avantajava para lá de Bagdad.

Então e esse fim de semana de calor, hum?
Muita praia, muito gelado, muita bola de berlim?
Suas gordas!

22 de julho de 2016

Espelho meu, espelho meu

Qual destes dois equipamentos hei de escolher eu?!
É que vou fazer um percurso cheio de beldades e não quero fazer má figura.
Hum, que dizeis?

Claro que é tudo daqui! Da equipa das campeãs das 5 Quinas!!

Uma zebra entre cavalos

Há muitas razões para a diferença.
Não se é diferente apenas porque a cor é diferente, a forma de andar é diferente, a capacidade intelectual é diferente, o emprego é diferente e a classe social é diferente.
A diferença (ou fazer a diferença) é das coisas mais difíceis de alcançar quando nos encontramos no meio de tantos iguais.
Pus-me a pensar neste tema, aí num dia qualquer, em que uma pessoa com a mania que é diferente, e que não pode estar mais enganada, se atravessou à minha frente como se fosse uma zebra entre cavalos.
Toda a gente sabe, ou pelos menos eu sei, que as zebras têm um belíssimo aspeto, são tremendamente sexy, bamboleiam os largos quadris de listas pretas pela savana, mas não servem absolutamente para nada. São no entanto de famílias ricas, de famílias que cumprimentam com um só urro, de famílias que se habituaram desde cedo a uma certa superioridade que julgam como diferença. Este complexo sistema social que vemos nas zebras, permite-lhes olharem para os cavalos, esses sim com verdadeiras competências, de forma altiva e, no meu entender, ridícula.
Custa-me ver assim as zebras, tão penosamente pedantes, tão enganadamente diferentes.
Percebo que se julguem superiores por nunca se terem deixado domesticar, apesar das várias tentativas. Elas não se submetem à doma, ao cabresto, à arreata, e logo que pressentem o perigo, dão um coice para ar.


Barão de Rothschild, o inglês Lionel Walter Rothschild (1868-1937)

Há muitos caminhos para a diferença.
Ser-se uma zebra entre cavalos é o caminho mais fácil.
O difícil é ser-se um excelente cavalo entre tantos bons cavalos.

18 de julho de 2016

Canal Caveira

A primeira lembrança que tenho de Canal Caveira é de me apear de um Mini-Morris vermelho esbugalhado (onde vinha aninhada entre as pernas da minha avó no banco da frente), ver o meu pai em tronco nu, cabelo muito amarelo, olhos azuis muito alegres, a tabaquear o caso e a dizer: 'almoçamos aqui e ainda vamos a tempo de jantar na Corte Brique'.
Dentro daquele carro ainda viajavam a minha mãe, a Fátima e o Zé - dois retornados enormes e barulhentos - o filho deles, que vinha ao colo da mãe que ia ao colo do pai, e o nosso Banana, completamente grog depois de umas pastilhas para gatos assanhados que a minha mãe arranjava na fábrica mas que nunca falhava a 1ª viagem de verão ao Alentejo.
Canal Caveira foi onde me apeei muitos anos seguidos e durante um longuíssimo tempo da minha vida, com as pessoas que mais me disseram até hoje. Foram os melhores tempos de todos, foram os tempos em que demorávamos um dia inteiro para ir de Lisboa a Santa-Clara-a-Velha, onde as veredas cheias de silvas e amoras, fontes de água fresca e serras a cheirar a pão, me fazem agora chorar.
A paragem em Canal Caveira era um compasso do coração; era ali que o meu pai em pé e de mãos no quadril para esticar a barriga para a frente, me comprava um Capri-Sonne e me dizia.
- Estamos quase a chegar.
E chegávamos noite cerrada, e eu sem medo do caminho escuro que ia dar ao monte, deixava explodir o coração nos braços da minha avó pequenina, a espantava-a muito por estar cada vez mais alta, mais magra e mais parecida com a minha mãe.

Depois o meu pai vendeu o nosso Mini por 15 contos.
Depois uns senhores não trataram bem da minha avó, e ela morreu-nos numa maca de hospital.
Depois a vida levou-nos por auto-estradas que iam dar diretamente ao Algarve.
Depois começámos a matar as saudades do Alentejo por Facebook.
Depois apareceram os blogs e descobrimos que os melhores anos da nossa vida são de somenos, que somos de uma estirpe muito perigosa e de uma dimensão planetária inferior, porque parávamos em Canal Caveira para almoçar, a caminho do Alentejo.

"Olhei para trás, chorando,
 Minha terra da minh'alma
Tão longe me vais ficando."

15 de julho de 2016

Je ne sais plus qui je suis



 Igor Morski || Polish graphic designer, illustrator and set designer.


A Europa parece-me agora muito mais difícil de amar.
Espera-nos uma guerra muito difícil de matar, talvez das mais fortes e violentas de todas, talvez das mais difíceis de esquecer. É uma guerra auto-imune, que nos mata de dentro.
Os vermes que agora se escondem atrás de pessoas comuns, pois que são com efeito pessoas comuns, ainda que incomuns, vão perceber tarde o terrível erro que foi amar a morte mais do que a própria vida, reivindicando orgulhosamente para si todos estes terríveis atentados, gritando orgulhosamente o amor que sentem pela morte, pelos mortos e pelo céu, este último desde sempre e para sempre o maior cemitério da humanidade religiosa.

Há uma frase maravilhosa de Emily Jane Brontë, que explica tudo ao referir-se a um defunto que supostamente vagueava pela casa: "o espectro mostrou-se caprichoso, como costuma ser apanágio dos espectros: não deu sinais de existir."


Um dia sereis espectros.
A morte sequer existe caso a vida lhe negue essa esperança.
Um dia a Europa voltará a ser amada.
Um dia seremos vivos.

Je ne sais plus qui je suis, mais je sais que je suis vivant!

E aquela cena sinistra à porta do Ramiro?

E sou daquelas pessoas que prevaricam.
Prevaricar está entre as coisas que melhor sabemos fazer enquanto povo. Há quem lhe chame chique-espertisse, filha da putisse, eu chamo-lhe falta de paciência.
Quando está uma fila gigante para a casa de banho das meninas, eu vou à dos meninos. Temos pena. Não sou de famílias, pelo que posso ter comportamentos desviantes.
Nunca por nunca me apanham feliz e contente numa fila seja do que for, muito menos se for para as necessidades básicas, menos ainda se for para comer.
Isto para vos contar que ontem, depois de ter ido comprar 3 coletes salva-vidas (para aquilo que mais cedo ou mais tarde vou escarrapachar aqui no blog), deu-me uma súbita necessidade básica de beber uma imperial e mergulhar os dedos na água choca dos caracóis.
Pois que não consigo comer caracóis sem que me apeteça logo de seguida uma saladinha de polvo, mexilhões à espanhola, ou ameijoas à bulhão pato, pelo que se estás em Roma sê romano, e eu estando em Lisboa, no pino do verão, estou (naturalmente) enfiada numa marisqueira.

Marisqueiras em Lisboa há milhentas, mas as pessoas gostam mesmo é de ir todas ao Ramiro.
Ahh que é muito bom, vale a pena ficar ali 3 horas de pé, com sorte à sombra, com azar ao sol, chegar pelas três da tarde para ir a tempo de jantar, só para ir comer um qualquer diz-que-disse que é muito bom, sobretudo a torrada com manteiga, uma especialidade que quase ninguém tem a perícia de fazer como eles a fazem, que é feita pelo método ancestral de torrar o pão e meter-lhe manteiga por cima.
Enfim, metem dó.

Não sejam tóinos, não percam tempo em filas parvas (mesmo que à vossa frente sopre uma brisa que mostre a badana do rabo de uma sueca) quando há uma marisqueira e-s-p-e-t-a-c-u-l-a-r mesmo ao lado do Ramiro. É só entrar e pedir. Há uns 10 rapazes com ótimo ar a servir, ótimo marisco, bom ambiente, imenso espaço.
Tudo fresquíssimo.
De nada.




14 de julho de 2016

Maria José Portugal Portugal

Meus ricos meninos!

"Quase todos os alunos do Colégio Rainha D. Leonor têm 20 na disciplina de Direito" é o titulo que diz quase tudo na Gazeta das Caldas.

Não admira que houvesse mais amarelos na Avenida da Liberdade do que quando ganhou a nossa Seleção. No fundo esta é também uma espécie de seleção, mas enquanto a outra é natural, feita com base no trabalho e na dedicação dos atletas, estoutra é anti-natura, contra natura e indecente. Eu também quero entrar para a Universidade sem estudar, sem fazer testes na disciplinas opcionais, que são na verdade as mais me custam intelectualmente.
São tão retorcidos, tão imensamente inteligentes, decerto com uma aprendizagem feita também no mesmo colégio, que resolveram estoirar com as médias das disciplinas opcionais (as que não necessitam de exame nacional) e fazer coisas assim, de um nível intelectual superior: "casos em que alunos com notas negativas a disciplinas como Português e História (sujeitas a exame nacional) obtiveram entre 17 a 20 valores a Direito ou Sociologia.
Uau!
Este alunos são os maiores, são os melhores 193 alunos que o ensino português pariu, são tão bons, mas tão bons, que as médias de química, sociologia, inglês, biologia, e física nunca foram inferiores a 17,4 valores.

Ai ai ai, que só me apetece é ganir!

Se eu fosse a dona da 'Gazeta das Caldas' teria optado por esta parangona:

"E um bem grande das Caldas para este estabelecimento de ensino, hum?"

13 de julho de 2016

Ahh, os maridos...

Ao jantar, eu em frente dum prato com uma lata inteira de Minerva e um traçalhão de pão, ele a comer um terço de uma melancia marreca, sem acompanhamento à vista. Eu com um copázio até ao cagulo de vinho tinto, ele sem copo à vista.

- Estou furiosa!
- Atão?
- Esqueci-me do meu livro em cima da secretária. Que estupidez tão grande, credo! Estou a ler um livro tão lindo, mas tão lindo, lindo lindo lindo...
- Porque é que não te casas com o livro?
- (...)!!???
- Então, qual é o mal? Houve um gajo que se casou com um Iphone.

Os homens com fome são um bocadinho coiso, não é?

Falta de jeito para crianças, ou o cúmulo do fartanço

Anteontem, por educação, ou por querer matar a última hora que tinha pela frente antes de ver o escritório por trás, e, aproveitando que a pequena ML me eclodiu à porta do escritório qual visita inusitada, pelas mãos de um pai que mais parecia um adolescente antes do concerto dos Iron Maiden, resolvi correr com ela os vários andares do Rule of Law para que conhecesse algumas pessoas e para, como disse, abandonar sobre bom pretexto o filha da puta do telefone, do mail e do caralhinho mais velho das conversas sobre a selecção.


Podem não acreditar, que até eu pensava que estava a ver as coisas em repeat, tipo aquelas pessoas que acordam e estão sempre no mesmo dia, o que não deixa de ser o caso, mas toda a gente, tooooda a gente, depois de lhe dizerem muito espantadas (...) ai estás tão parecida com a tua mãe, lhe perguntaram: então? e gostaste do jogo da seleção? e do Ronaldo gostas? é giraço não é?
Todas, não sei se já disse.

Entretanto, num volte-face que muito me espantou, houve um causídico (instalado há pouco tempo no último gabinete junto à porta, e que vem a ser um novo sócio cá do sítio), que contra todas as minhas expetativas, resolveu fazer diferente.

- Então? e gostaste do jogo de ontem?
- Sim..
- E gostas aqui do trabalho da mãe?
- Hummmm.....
(olha para mim, buscando alguma coisa entre aprovação e desculpa-me por isto que vou dizer, e sai-se com esta pérola):
- Nem por isso. Gosto mais do trabalho do pai. Aqui é tudo muito... acho... assim... repetitivo.
- Hahahaha, estás tão parecida com a tua mãe!!

12 de julho de 2016

Eu também continuo a gostar dos franceses


Reality Show

Devido a um comportamento descarado, julgo que nascido de uma intempérie constante entre mim e a autoridade institucional - esta de difícil reconhecimento por ter sido impositiva durante uma grande parte da minha infância - é que tenho grandes discussões com quem amiúde me acompanha.
Sou tão observadora, e ao mesmo tempo tão distraída, que é muito comum que me apanhem de olhos fitos nas pessoas, observando-as, como se estivesse escondida atrás do grosso pano que separa a plateia da cena, ou como se  estivesse na posse de grandes óculos de lentes negras.
Este inocente comportamento, que faço sem perceber, é o que se pode chamar de cúmulo da não timidez, isto é, enfrento com um olhar curioso qualquer fulano que passe, sem me importar de ser apanhada.
'Não olhes assim para as pessoas!' é uma frase que já ouvi tantas vezes que, ao fim de tantos anos, resolvi dar-lhe uma certa importância.

Não pensem [que se enganam] que descurar a educação das crianças ou submetê-las a certos ambientes de forma continuada, não as marca para a vida. A melhor maneira de tornarem uma criança num adulto estúpido, muito estúpido, é não lhes explicarem porque raio precisam de se submeter a uma autoridade forjada nos canudos académicos, ou nas vozes afetadas ou cheias de dinheiro, que certas classes as submetem.
A ideia deste trecho, aqui meio perdido no meio do post, é para tentar explicar que quando uma criança não entende a autoridade, raramente se submete, e vulgarmente se revolta. Isto cura a timidez, conotada desde sempre com o medo, mas pode trazer problemas no futuro.
Foi exatamente o que me aconteceu.
Não me revoltei, mas perdi-lhes o medo, ou antes, perdi o medo de as olhar.

Percebo no entanto que é um comportamento incomodativo, malcriado, e invasivo. Há qualquer coisa de sinistro, dizem-me, em ter alguém a olhar-nos pensativamente, curiosamente, como se fossemos animais de laboratório. A maior parte das pessoas vai agora manear a cabeça, colocando-se no alvo dos meus olhos.
Que descaramento!
Está olhar para onde? Nunca viu?
Peço desculpa, distraí-me, há muito que perdi o medo.

Urge pois recolher os olhos.
Mas como é que nos conhecemos a nós, se não nos vemos no espelho dos outros?
Ahh, também já te aconteceu?

E porque toda a gente o faz, mais ou menos dissimuladamente, mais ou menos descaradamente, é que os reality shows têm tanto susexo.

11 de julho de 2016

A (t)Raça Portugal

O festim foi longo, barulhento e bem regado.
Regado de um estóico, augusto e extraordinário sentimento de pátria, nobreza, e valentia.
Assim reza o hino. Assim rezamos nós.
Amém.

6 de julho de 2016

O que seria de uma Uva se não falasse de vinhos?



Eu assumo-me uma Uva de casta Moscatel, derivado da minha doçura como pessoa.
Mas isso agora não interessa nada.
Este vinho que custa 2 euros e pico nos locais habituais, é muitíssimo bom, e digo-vos já, para aquelas ocasiões em que querem fazer brilharete (até podem fazer dois brilharetes e levar duas garrafas), experimentem levar este bem geladinho.
Depois venham cá dizer se não é bom ter uma amiga Uva.

Do aborrecimento (ou da ironia?)

" Pois não era verdade que um homem devia, pelo contrário, conhecer tudo, ser expedito em atividades multiplas, iniciar uma mulher nas energias da paixão, nos refinamentos da vida, em todos os mistérios? Mas aquele não ensinava nada, não sabia nada, não desejava nada. Julgava-a feliz; e ela ressentia-se daquela calma tão permanente, aquela gravidade serena, até da felicidade que ela própria lhe proporcionava." 

Gustave Flaubert, in Madame Bovary

Em 1856, Flaubert, um homem do tempo em que a imoralidade ainda sentava os escritores na cadeira dos réus, escreveu este pedacinho de texto, que veio a ser impresso na página 58 de um livro que comprei em Lisboa, 160 anos depois.
E que atual meus senhores.
Pois não é verdade que a emancipação das mulheres, o nível de instrução, a energia que resulta da capacidade de ser tantas numa só, a luta pela independência, também dos filhos, a preocupação com os pais, com a casa, as prestações, a depilação, as férias, as cabras das colegas, o mestrado tardio, quiçá uma gravidez idosa, os mil braços e pernas, um coração grande e assassino (se isso não comprometer a beleza), deixou a ala masculina aborrecida, mole e tristonha?
Que é feito dos cavaleiros, ou como cantava Paula Cove "Where Have All the Cowboys Gone"

I will do the laundry
If you pay all the bills
Where is my John Wayne
Where is my prairie song
Where is my happy ending
Where have all the cowboys gone

Não são, no entanto, os homens de agora mais felizes, libertos das tarefas que nunca assumiram por completo, e também das outras que iam fazendo por obrigação?

5 de julho de 2016

Daquilo que me dá nos nervos

Então, estás a gostar? Estás a reler? Já li esse há anos sem fim, chiii, já nem me lembro quantos anos tinha! Ahh esse é muito bom, mas li-o na adolescência... Ainda nos clássicos? Esse Dostoievski é um bocadinho maçudo, li-o com 6 anos e não gostei muito...

Descobri um novo tipo de pessoas. Os pós-leitores.
Os pós-leitores são uma espécie que saiu muito adiantada em relação aos outros leitores; são aqueles que aos 6 anos de idade já tinham devorado meia lista dos melhores 100 livros para ler na vida, incluindo aquela porcaria indecifrável do James Joyce. São leitores com uma voragem tal, que não há um único livro com mais de 100 anos que não tenham lido seguramente 3 vezes.
Não me interpretem mal. Não me sinto inferiorizada por ter quase 40 anos e estar a ler a Madame Bovary pela primeira vez, logo depois de ter terminado o Grande Gatsby. Sinto-me aliás muito bem. Há muito que venho assumindo que tenho grandes falhas na cultura literária, porque sou uma leitora bastante tardia dos bons (e maus) livros, vulgo, grandes clássicos, porque para se ler bons livros numa certa altura da vida, é preciso ter quem lhos indique, e eu não tive.
A minha filha de 9 anos já leu mais livros do que eu com 20. Porque a obrigo, porque lhos compro, porque lhe faço esperas à porta do quarto e pergunto: então filhinha, quantas páginas leste hoje? e é um jogo, uma tarefa, um objetivo, que tenho e faço por vencer, de passar hábitos bons e arreigados de leitura à ML, porque sei a falta que nos faz a cultura literária, o saber ler bem, falar bem, pensar bem.
Não me aborrecem tanto as pessoas aborrecidas como me aborrecem as pessoas que me olham com uma certa sobranceria, com uma espécie de altivez que as coloca num patamar elevadíssimo, só porque leram o Guerra e Paz nos primeiros anos de vida.
É como se fossemos os coitadinhos da leitura, os que só agora, em velhos, conseguem perceber, coitadinhos, que há livros incontornáveis, e que coitadinhos, têm de andar a estudar as cadeiras atrasadas, como um fardo, coitadinhos, quando já podiam ser seres superiores, de canudo literário nas mãos, detentores de um conhecimento especial que os coloca acima de qualquer outro ser humano.

Há uma frase muito linda, muito eu, do Almada Negreiros (e que está na estação de Metro do Saldanha), que diz assim:

“Entrei numa livraria. Pus-me a contar os livros que há para ler e os anos que terei de vida. Não chegam! Não duro nem para metade da livraria! Deve haver certamente outras maneiras de uma pessoa se salvar, senão… estou perdido."

Julgo que diz tudo - sobre todos.

4 de julho de 2016

Eu tenho porras, não sei se já vos tinha dito...


Sim. É um cão a pilhas, uma ratazana, uma doninha.
Mas está na short list para meter a Meca nos eixos.


1 de julho de 2016

Que bonitinho

Uma das pessoas que mais admiro nisto dos blogs é simultâneamente a miúda que melhor domina a difícil técnica literária 'fluxo de consciência', e a que me deixou o comentário mais desassossegado quando resolvi atirar-me do comboio.
Dizia ela que sou das pessoas que têm coisas a dizer ao mundo e que por isso não me deveria calar.
Concordo. Se tenho coisas para dizer a minha urgência é dizê-las, mas assim sendo o que fazer às horas e horas, ao tempo e tempo de meditação e reflexão que me levaram sempre à mesma conclusão? Se quem mantém em cativeiro todos os seus juízos é o mais inteligente, então devo entregar-me à mediocridade? Ou devo antes lançar-me aos leões e desatar a ajuizar como se não houvesse amanhã?
É este o colossal problema que referia dois posts mais abaixo.
Parece-me óbvio que somos todos medíocres porque apesar de sermos muito sensíveis às opiniões desbragadas dos outros, não dispensamos uma boa alfinetada vodu.
Que se lixe. Isto não é nenhum concurso de QI e vou seguir em frente com as letras, aventurando-me no tema que não fui capaz de exprimir na rede social da família, onde pretendo manter uma aura mítica de supra inteligência.
Se é que me faço entender.

Então é isto: o que é que deu nas mãezinhas para desatarem a postar as notas da miudagem no Facebook? É alguma promessa que fizeram a N.ª (Vossa) Senhora de Fátima?, aos peixinhos do Padre António Vieira?, é uma espécie de medalha pela vossa própria mediocridade enquanto estudantes, que faziam de tudo para esconder essas mesmas notas de toda a gente?, é para dizerem ao mundo que têm ali um carro desportivo cheio de cavalos na cabeça? é para humilharem os que têm filhos com dificuldades de aprendizagem?, é porque são gordas, magras, divorciadas ou mal casadas mas os vossos filhos conseguiram ultrapassar esse pequeno pormenor e ainda vos enchem o coração de orgulho? é um troféu que só a eles (e só a eles) interessa mas como são vossos filhos podem tudo até usurpar-lhe o mérito como se ele fosse vosso?
O que é não sei, mas é feio, feio, feio, e é estúpido, é sinistro, é aberrante, é pior do que dizer na cara de uma gorda que a acha um bocadinho mais gorda, é mais violento do que dar uma chapada na cara do filho no dia dos anos, à frente de todos os amigos que vieram para a festa.

Peço desculpa por não conseguir guardar mais tempo este esdrúxulo pensamento, peço desculpa por não ter guardado para mim este juízo, esta moral, mas JE SUIS NIILISTA, para mim, como para Nietzsche, "a moral não tem importância e os valores morais não têm qualquer validade, só são úteis ou inúteis consoante a situação".


E vou mais longe abusando do filósofo.
Quanto mais me elevo, menor eu pareço aos olhos de quem não sabe voar.